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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

GÉNESIS

Introdução
Num tempo de tantas heresias, de ideias contraditórias, neste século quando fervilham propostas supostamente novas, é oportuno estudarmos a antiga Palavra. Uma abordagem possível e proveitosa é estudarmos os temas envolvidos nesse caldeirão, tentando descobrir respostas para satisfação do próprio intelecto e coração e também para atacar ou se defender de possíveis ataques. Mas um estudo sólido e sistemático da Palavra de Deus pode fornecer-nos o embasamento necessário para quaisquer situações.
 “Génesis” é um nome adequado. É um termo grego que significa “fonte, origem” e foi escolhido por aqueles que traduziram as Escrituras, do hebraico “no princípio” para o grego. Essa versão se tornou conhecida como a “Sptuaginta” (frequentemente representada pelo símbolo LXX), porque consta que o número dos tradutores era setenta. Foi elaborada para atender aos judeus da “Dispersão” que habitavam no Egito e em outros países e que haviam perdido a familiaridade com a língua de seus pais. Ambos os nomes são apropriados, pois Génesis prepara o terreno para a plena compreensão da fé bíblica.
Tem sido chamado o viveiro das gerações da Bíblia, pelo facto de nele se encontrarem todos os começos de todas as grandes doutrinas referentes a Deus, ao homem, ao pecado e à salvação.
A palavra “gerações” indica as sucessivas divisões do livro e o processo gradual pelo qual o propósito divino vai-se concentrando numa linha especial de genealogia, caminhando para que o conhecimento de Jeová se dê através de Israel. Notemos essa palavra (ou termo semelhante) em 2:4; 5:1: 6:9; 10:1; 11:10, 27; 25:12, 19; 36:1; 37:2. Cada um desses versículos introduz uma nova secção, na qual são apresentadas as “gerações” ou a descendência da pessoa ali mencionada. As histórias de Ismael e Isaú constituem pequenas digressões que são logo abandonadas, e a narrativa retoma a linhagem da promessa através de Isaque e Jacó.
Génesis é o primeiro dos cinco livros de Moisés, conhecidos como o Pentateuco e também intitulado “a lei” (ver Lc. 24:44). Os autores do Novo Testamento unanimemente atribuem a Moisés essa autoria (ver Mt. 19:8; Mc. 12:26; Lc. 16:31; Jo. 5:46). Mas, sem dúvida, ele incorporou à narrativa tradições sagradas, passadas de pai para filho desde os patriarcas, havendo indícios da mão de um editor, possivelmente Esdras.
Quero ser especialmente cuidadoso ao abordar este primeiro capítulo de Génesis.
A Bíblia não procura provar a existência de Deus e nem sequer discute teorias sobre a Sua existência. Aquilo que a Bíblia diz sobre Deus, não está registado para dar provas de verdades empíricas, mas para desafiar a fé em Deus. Afinal, a fé vem pelo ouvir da Palavra e não pelo comprovar os factos. Portanto, Ela simplesmente anuncia a realidade de Deus pelo óbvio que é, pois não crer em Deus é pensar de maneira falha e distorcida. Para observar o mundo físico e concluir que Deus não existe requer malabarismos mentais extraordinários – tais como os da teoria da evolução. A Bíblia declara: “diz o néscio no seu coração: Não há Deus” (Sl. 53:1). E por quê?
Por causa do seu orgulho, o ímpio não O busca; todos os seus pensamentos são: “Não há Deus” (Sl. 10:4). Na vida do tolo não há lugar para Deus.
Algumas teorias recentes e conclusões dos cientistas têm contestado a interpretação tradicional do relato bíblico da criação. Num esforço consciencioso para provar que a Bíblia é cientificamente acurada, o Dr. B. B. Warfield expõe bem o problema:
“Uma janela de vidro está diante de nós. Levantamos os olhos e vemos o vidro; notamos a sua qualidade, observamos os seus defeitos e especulamos sobre a sua composição. Ou olhamos através dele na perspectiva de ver além terra, céu e mar. Da mesma forma, há duas maneiras de se olhar o mundo. Podemos ver o mundo e ficarmos absorvidos pelas maravilhas da natureza. Essa é a maneira científica. Ou podemos olhar diretamente através do mundo e ver Deus por detrás dele. Essa é a maneira religiosa.
A maneira científica de olhar para o mundo não é mais errada do que a maneira do fabricante do vidro olhar para a janela. Essa maneira de olhar para as coisas tem um uso muito importante. No entanto, a janela foi colocada não para ser observada, mas para observarmos através dela, e o mundo falha em seu propósito a menos que também olhemos através dele e os olhos repousem não nele mas no Deus que o fez.”
O que podemos dizer com certeza é que o autor de Génesis não escreveu o relato da criação para o fabricante de vidros, mas para pessoas como nós que param diante da janela e admiram a paisagem através dela. Génesis foi escrito para que as pessoas pudessem olhar através do vidro de seu relato para o Criador por detrás do universo e ser admirado como tal. A Bíblia tem razão em cantar: “Quando me extasio a olhar o céu estrelado, quando contemplo as noites de luar, e penso que foste Tu seu criador, eu me pergunto: Que valor imenso não deve ter o ser humano, para estar sempre na tua lembrança e ser tratado com tanto carinho?” (Sl. 8:3-4).
Génesis, o portão da entrada da Bíblia, foi escrito para o povo de Deus, não para os descrentes. É a primeira coisa que se vê, e quase a última a ser escrita! É a varanda bonita, onde Deus recebe o povo oprimido que sofria no cativeiro, para consolá-lo e animá-lo novamente para a caminhada. Não foi escrito para ensinar ciências, geografia ou história, mas sim para devolver a fé, a esperança e o amor a um povo explorado, descrente e desanimado de tudo, para ajudá-lo a reconhecer os seus erros, olhar o mundo com um olhar mais crítico e descobrir sua missão como povo de Deus no meio da humanidade. Os homens que se recusam a crer no criacionismo não o fazem por ausência de factos ou de provas (cf. Rm. 1:18s), ou devido ao seu grande conhecimento (Sl. 14:1), mas devido a ausência de fé (Hb.11:3). Génesis é muito mais uma declaração do que uma defesa.
Por isso, a primeira coisa de que precisamos para captar bem a mensagem de Génesis, é sintonizar-nos na mesma frequência em que a Bíblia transmite a sua mensagem. Precisamos de acertar os olhos com que lemos as histórias da Bíblia sobre a origem do mundo e da humanidade. Pois a leitura ao pé da letra falsificou nosso relacionamento não só com o texto bíblico que fala da criação, mas também com a terra que nos sustenta.
O panorama essencial à nossa compreensão do significado e da mensagem da criação é o daqueles que primeiramente receberam este livro. Supondo que Moisés tenha sido o autor de Génesis, o livro provavelmente teria sido escrito em alguma época depois do êxodo e antes da entrada na terra de Canaã. Qual seria a situação na época em que foi escrito este relato da criação? Quem recebeu essa revelação e quais necessidades foram satisfeitas por ele? Isto é crucial à correta interpretação e aplicação da mensagem da criação.
Muitas vezes falhamos ao aplicar o primeiro capítulo de Génesis de maneira relevante às nossas próprias vidas espirituais. Olhamos para a mensagem de Génesis 1 e não esperamos nada mais além de ter nossas baterias apologéticas recarregadas novamente.
Génesis é a parte inicial de um todo. Não é por acaso que ele ocupa o primeiro lugar no conjunto de escritos que formam a Bíblia. E isso se deve a três razões principais: 1) nele estão as nascentes das grandes linhas de pensamento bíblico; 2) narra o começo de todas as coisas, começo que determina tudo o que acontece depois, inclusive o fim; 3) face à deturpação da criação existente em seu tempo, mostra, de modo magnífico, o que a criação é. Sendo que o todo, a Bíblia, tem a Cristo como seu fundamento e seu centro, minha reflexão aqui não poderia ficar restrita ao Génesis e deixar de lado, em questões vitais, a palavra decisiva daquele que é o autor e realizador de nossa fé.
O relato da criação vem a ser um assunto importante em todo o Velho e Novo Testamento. Aqui, como em outros lugares, não podemos errar, mas permitir que as Escrituras interpretem as próprias Escrituras. Quando o assunto da criação aparece nas Escrituras requer uma reação dos homens. Quando ensinamos Génesis capítulo 1 muitas vezes falhamos em despertar qualquer tipo reação.
Génesis 1 e 2
A Criação dos Céus e da Terra (Gn. 1:1-2:3)
 No Princípio
Através de todo o primeiro capítulo, esta palavra (no principio), é mais do que uma simples indicação de tempo. As variações sobre este tema em Isaías 40 mostram que a história do princípio de todas as coisas – o princípio do céu e da terra, o princípio de todas as formas de vida e de todas as instituições e relações humanas -, está impregnado do fim, e que o processo todo é presente para Deus, que é o Primeiro e o Último, e parece-nos muito próprio esse uso, devido ao facto de que se trata do Deus Criador, portanto, majestoso, omnipotente.
A ciência tem determinado que tudo o que há no universo pode se encaixar em uma destas cinco categorias: tempo, ação, força, espaço e matéria. Seja isso verdade ou não, é extremamente interessante que o primeiro versículo da Bíblia fala justamente nestes termos: “No princípio (tempo), criou (ação) Deus (força) os céus (espaço) e a terra (matéria)”. “Criou” é uma palavra que descreve a atividade divina.
O primeiro dia, não foi o primeiro dia de existência dos céus e da terra pois Deus os criou “no princípio”. Quando foi este princípio a Bíblia não diz. Se os geologistas dizem que foi há bilhões de anos atrás, é bem provável que seja. Quanto à Bíblia, não há problemas em relação a isto. O que a Bíblia ensina é que Deus criou os céus e a terra, no princípio, no passado eterno. A terra não foi criada sem forma e vazia. Ao invés disso ela tornou-se assim.
Deus se revela na Bíblia como um ser infinito, eterno, Auto existente e como a Causa Primária de tudo o que existe. Deus, que é sem começo e sem fim, criou o universo físico em um dado momento (veja Hb. 1:2 e 11:3). Este foi “o princípio” de que nos fala Génesis 1:1. Os anjos, seres espirituais (Hb. 1:14), aparentemente tiveram sua criação antes deste “princípio” do universo físico” (Jó 38:4-7).
Nunca houve um momento em que Deus não existisse. Conforme afirma Moisés: “Antes que os montes nascessem, ou que tu formasses a terra e o mundo, sim, de eternidade a eternidade, tu és Deus” (Sl 90.2). Noutras palavras, Deus existiu eterna e infinitamente antes de criar o universo finito. Ele é anterior a toda criação, no céu e na terra, está acima e não depende dela (ver 1 Tm. 6:16 nota; Cl. 1:16).
Deus se revela como um ser pessoal que criou Adão e Eva “à sua imagem” (1:27; ver 1:26 nota). Porque Adão e Eva foram criados à imagem de Deus, podiam comunicar-se com Ele, e também com Ele ter comunhão de modo amoroso e pessoal.
Deus também se revela como um ser moral que criou tudo bom e, portanto, sem pecado. Ao terminar Deus a obra da criação, contemplou tudo o que fizera e observou que era “muito bom” (1:31). Posto que Adão e Eva foram criados à imagem e semelhança de Deus, eles também não tinham pecado. O pecado entrou na existência humana quando Eva foi tentada pela serpente, ou Satanás (Gn. 3; Rm. 5:12; Ap. 12:9).
O primeiro versículo anuncia o propósito do livro. “No princípio criou Deus os céus e a terra” - O verbo “criar” (hb.“bara”) é usado exclusivamente em referência a uma atividade que somente Deus pode realizar. Significa que, num momento específico, Deus criou a matéria e a substância, que antes nunca existiram. Os israelitas, aos quais foi primeiramente dirigida a mensagem do livro, aprenderam que o Deus da Palestina era também o Deus de todos os países, e que o Deus de uma nação – Israel – era também o Deus de todas as nações. Ora sendo Ele o Deus e Criador de toda a terra, devia por fim tornar-se o Redentor de toda a terra. O livro relata como se tornou necessária a redenção, devido ter o homem pecado e caído nas trevas; e como Deus agiu para escolher uma nação a fim de que esta fizesse chegar a luz da verdade divina às demais nações.
Todos os começos devem principiar com Deus. Ponhamos sempre Deus em primeiro lugar. A primeira pedra de cada construção, nosso primeiro pensamento todos os dias, os objetivos e propósitos principais de toda a atividade devem ser dedicados a Deus. Comecemos o livro do ano com Deus, e assim chegaremos ao final dele com a glória da nova Jerusalém. A princípio como na criação física, nosso coração e vida podem parecer “sem forma e vazios”. Não desanimemos. O Espírito de Deus está dentro de nós, pairando no meio das trevas e, oportunamente, sua luz brilhará. É a bendita presença do Senhor Jesus que se agita em nosso coração e, dentro em pouco, dirigirá a nossa vida (Jo.1:4). A presença dEle faz separação entre o bem e o mal. Precisamos de distinguir entre Cristo e o ego. Sigamos o clarão e não andaremos em trevas, mas teremos a luz da vida. Os dias de Deus começam ao entardecer e terminam sempre ao amanhecer.
O Cenário Histórico de Génesis 1-2
Senhor da história. Para o Génesis não há dúvidas: é Deus e não o homem quem começa a história e a dirige. Como muito bem destaca Gerhard von Rad em sua Teologia do Antigo Testamento, a criação é a primeira obra de Deus dentro do tempo. Ela inicia a história. Mas ela não está só, outras obras do Deus criador vão segui-la dentro do tempo e da história. Deus não pode ser plenamente Senhor do homem sem ser também Senhor da história. A soberania de Deus sobre o homem e a soberania de Deus na história andam juntas. Como diz Paul Ricoeur (História e Verdade), devido a ser o soberano do homem, Deus é também o soberano da história.
O que o Génesis faz em primeiro lugar é que os leitores tenham um encontro com o Deus criador de todos os seres e coisas deste mundo, e logo o apresenta como o principal protagonista da história das origens. Uma análise cuidadosa do conteúdo das narrativas dos capítulos 1 e 2 revela o seguinte: Deus é o sujeito e a criação manifesta seu poder cósmico único; e o fato de ser o Criador comparece na base de sua soberania e da fé nele.
Desde o início, Génesis nos confronta com o Deus vivo, Deus inequivocamente pessoal. Estudando-se Génesis em seus próprios termos, isto é, como um todo vivo, não um corpo a ser dissecado, não se pode fugir da impressão de que os seus personagens são pessoas de carne e ossos, de que os acontecimentos que relata são reais, e de que o livro em si mesmo constitui uma unidade.
A revelação nunca é dada num vácuo histórico. Quase sempre é posta no contexto de eventos históricos e pessoas de carne e osso. A Bíblia fala aos homens em situações específicas e por motivos especiais. Ao dar uma revelação, ou invocar um certo procedimento, Deus frequentemente Se valia da oportunidade para Se referir a alguma experiência real pela qual os ouvintes tinham passado. Esta é uma das características das revelações da Bíblia, mas este facto em si jamais perturba qualquer um de nós, nem nos impede de crer que aqueles conselhos da Palavra de Deus se aplicam também a nós. Não podemos interpretar corretamente as Escrituras ou aplicá-las a nós mesmos até que tenhamos respondido à questão: “O que esta passagem queria dizer àqueles a quem originalmente foi dada”? Muitas coisas sobre a literatura, cultura e religiosidade dos povos que cercavam os israelitas são conhecidas através de estudos arqueológicos. O conhecimento de factos contemporâneos aos Israelitas aumentará grandemente nossa compreensão do significado do relato da criação de acordo com a revelação divina, tal como é encontrada em Génesis 1.
Primeiro, sabemos que, virtualmente, todas as nações tinham a sua própria cosmogonia, ou relato(s) da criação. De certo modo, sempre pensei que o relato da criação de Génesis 1 fosse algo novo e original. De facto, esta revelação veio tarde se comparada à de outras nações do Oriente Médio. A Antiguidade devotava muito tempo e esforço às suas origens. O relato de Génesis capítulo 1 tinha que “competir”, por assim dizer, com outros relatos de sua época.
Segundo, há quase que uma similaridade marcante entre esses relatos pagãos da formação do cosmos. De seus estudos dos doze mitos, a Sra. Wakeman identificou três características sempre presentes: 1) um monstro repressivo restringindo a criação; 2) a derrota do monstro por um deus heroico que liberta as forças vitais para a vida; 3) o controle final do herói sobre essas forças.”
Terceiro, ainda que aflija alguns, há consideráveis semelhanças entre os mitos da criação pagã e o relato inspirado da criação na Bíblia. A correspondência inclui o uso de alguns dos mesmos termos (por exemplo, Leviatã) ou descrições (por exemplo, um dragão ou monstro marinho), forma literária similar e sequência de eventos paralelos na criação.
A explicação de algumas dessas semelhanças são inaceitáveis. Por exemplo, dizem que essas semelhanças evidenciam o facto de que a cosmogonia bíblica não é diferente de qualquer outro mito antigo da criação. Outros nos assegurariam que, ainda que haja semelhanças, os Israelitas “desmistificaram” esses relatos corrompidos para assegurar um relato acurado da origem da terra e do homem. Alguns estudiosos conservadores simplesmente chamam a correspondência de coincidência, apesar de isto parecer evitar as dificuldades ao invés de explicá-las. A explicação mais aceitável é que as semelhanças são explicadas pelo facto de que todos os relatos similares da criação tentam explicar os mesmos fenómenos.
“Muito cedo os povos se desviaram daquelas primeiras tradições da raça humana, e em climas e temperaturas variadas, têm-nas modificado de acordo com a sua religião e modo de pensar. As modificações com o tempo resultaram na corrupção da tradição pura e original. O relato de Génesis não é o único inalterado, mas em qualquer lugar sustenta a inerrante impressão da inspiração divina quando comparado às extravagâncias e corrupções de outros relatos. A narrativa bíblica, podemos concluir, representa a forma original que deve ter sido assumida por essas tradições”.
Mais importante que o facto de que as nações ao redor de Israel tinham seus próprios (talvez mais antigos) relatos da criação foi o uso para o qual esses relatos foram colocados no antigo Oriente Médio. Os antigos estudos do cosmos não foram cuidadosamente registados e preservados por amor à história antiga; eles foram o fundamento de costumes religiosos.
As divindades do mundo antigo foram deuses da natureza, como o deus sol, deus lua, deus chuva e assim por diante. Para assegurar o curso das forças da natureza e garantir a colheita abundante e os rebanhos de gado, os mitos da criação eram encenados todos os anos.
“Os mitos, então, no mundo antigo, eram reencenados através de pantomimas em festivais públicos para acompanhamento dos rituais. Uma complexa estrutura compunha a mágica encenação, cujo efeito, acreditava-se, seria benéfico a toda comunidade. Através de rituais aromáticos eram revividos os primeiros eventos registados na mitologia. Acreditava-se que a encenação das ações criadoras dos deuses na estação própria, e a declamação de uma fórmula verbal apropriada faria a renovação periódica e a revitalização da natureza, e assim asseguraria a prosperidade da comunidade.
Por esse cenário podemos começar a perceber quão vital foi o papel encenado pelo estudo do cosmos no antigo Oriente Médio. A vida social e religiosa de Israel, como a de seus vizinhos, era baseada em suas origens. O relato da criação em Génesis estabeleceu o fundamento para o restante do Pentateuco.
Sob essa luz podemos ver a importância do contexto entre o Deus de Israel e os “deuses” do Egito. Faraó ousou perguntar a Moisés “Quem é o Senhor para que eu obedeça à sua voz e deixe ir a Israel”? (Ex. 5:2).
A resposta do Senhor foi uma série de dez pragas. A mensagem dessas pragas foi que o Deus de Israel é o Deus criador dos céus e da terra. “Porque, naquela noite, passarei pela terra do Egito e ferirei na terra do Egito todos os primogénitos, desde os homens até os animais; executarei juízo sobre todos os deuses do Egito. Eu sou o Senhor” (Ex. 12:12, cf. 18:11; Nm. 33:4)
Parecia que cada praga era uma afronta direta a algum dos muitos deuses do Egito. Ainda que uma correlação direta de cada praga com um deus específico possa ser um tanto especulativa, a batalha dos deuses é evidente.
Não é de se estranhar que o sinal da aliança dos Israelitas fosse a guarda do sábado: “Tu, pois, falarás aos filhos de Israel e lhes dirás: Certamente, guardareis os meus sábados, pois é sinal entre mim e vós nas vossas gerações; para que saibais que eu sou o Senhor, que vos santifica... Entre mim e os filhos de Israel é sinal para sempre, em seis dias, fez o Senhor os céus e a terra e, ao sétimo dia, descansou, e tomou alento” (Ex. 31:13, 17).
A observância do sábado identificava Israel com o seu Deus, o Criador que descansou de seu trabalho no sétimo dia.
Os milagres do Êxodo tiveram, então, uma função similar à dos sinais e maravilhas realizados por nosso Senhor. Eles autenticaram a mensagem que foi proclamada. No caso de nosso Senhor foram as palavras que Ele proclamou e os escritores inspirados preservaram. No caso do Êxodo, o Pentateuco foi a revelação de Deus escrita por Moisés que seus milagres autenticaram. O Êxodo provou ser Yahweh o único Deus, o Criador e Redentor. O Pentateuco forneceu o conteúdo para a fé de Israel, do qual o relato da criação é o fundamento.
Génesis 1:1-3
Poucos tópicos têm sido objeto de tanta especulação como o tópico da criação.
Com tal beleza, ordem, exatidão, adaptação, majestade, simplicidade, planeamento e arquitetura inteligente, começa o relato da Criação em Génesis. Veja por si mesmo todas as maravilhas naturais como por exemplo: o perfume das rosas, as cores, o brilho das estrelas, a teia da aranha, a organização de um formigueiro, o funcionamento do corpo humano entre outros infinitos fenómenos. Poderia tudo isso ter surgido de um simples acaso? De uma grande explosão (big bang)? Deus ensina através da Bíblia Sagrada que tudo tem um fundamento e tudo o que existe foi criado pela própria vontade de Deus. Porém, uma análise do capítulo 1 de Génesis não é tão simples e direta como uma leitura casual do texto bíblico poderia sugerir. A interpretação moderna da cosmogonia (estudo das origens) bíblica em Génesis 1 é extremamente complicada, dividida entre a interpretação não literal e a literal.
Há muitas interpretações para os três primeiros versos da Bíblia, mas mencionaremos brevemente as três mais popularmente sustentadas pelos evangélicos. Não gastaremos muito tempo aqui, pois nossas conclusões não serão finais e as diferenças têm pouca influência na aplicação do texto. Deixe-me começar simplesmente dizendo que nós, que somos chamados pelo nome de Cristo, devemos, no final das contas, tomar Génesis 1:1 ao pé da letra, pela fé (Hb. 11:3).
Primeira opinião: A Teoria da Recriação (ou lacuna). Esta opinião sustenta que Génesis 1:1 descreve a criação original da terra, anterior à queda de Satanás (Is. 14:12-15, Ez. 28:12s). Em consequência da queda de Satanás a terra perdeu seu estado original de beleza e glória e se encontrou no estado de caos de Génesis 1:2. Essa “lacuna” entre os versos 1 e 2 não só ajuda a explicar o ensino a respeito da queda de Satanás, mas também permite um considerável período de tempo, o qual ajuda a harmonizar o relato da criação com as modernas teorias científicas. Esta teoria sofre de uma série de dificuldades.
Segunda opinião: A Teoria do Caos Inicial. Brevemente, esta opinião sustenta que o verso 1 seria uma frase introdutória independente. O verso 2 descreveria o estado da criação inicial como sem forma e vazia. Em outras palavras, o universo é como um bloco bruto de granito antes do escultor começar a moldá-lo. A criação não está em mau estado em consequência de alguma queda catastrófica, mas simplesmente em seu estado informe inicial, como um monte de barro nas mãos do oleiro. Os versos 3 e seguintes começam a descrever o trabalho de Deus e a modelagem da massa, transformando-a do caos no cosmos. Muitos estudiosos respeitáveis sustentam esta posição.
Terceira opinião: A Teoria do Caos Pré-Criação. Nesta opinião (sustentada pelo Dr. Waltke) o verso 1 ou é entendido como uma oração independente (“Quando Deus começou a criar...”) ou como um enunciado introdutório independente e resumido (“No princípio criou Deus...”). O relato da criação resumido no verso 1 começa no verso 2. Esta “criação” não é “ex nihilo” (do nada), mas por causa das coisas existentes no verso 2. De onde isto vem não é explicado nesses versos. Em consequência, esta opinião sustenta que o estado caótico não ocorre entre os versos 1 e 2, mas antes do verso 1 numa época não especificada. A origem absoluta da matéria é, então, não o objeto da “criação” de Génesis 1, mas apenas o princípio relativo do mundo e da civilização como a conhecemos hoje.
Podemos resumir as diferenças entre esses três pontos de vista da seguinte maneira:
1º. Ponto de Vista: Criação Original (Gn. 1:1). Queda de Satanás – Caos (Gn. 1:2) e Recriação (Gn. 1:3s).
2º. Ponto de Vista: Queda de Satanás – Caos (Gn. 1:2) e Cosmos (Gn. 1:3s).
3º. Ponto de Vista: Caos (Gn. 1:2) e Queda de Satanás – Cosmos (Criação).
Os Seis Dias da Criação (Gn. 1:1-31).
É importante reconhecer que os versos 2 a 31 nada mais são do que uma pequena expansão do verso 1. Eles não explicam completamente a criação (certamente não do modo científico - quem teria se preocupado com isso durante todos esses anos?). Nem a provam, pois, no final das contas, isto é uma questão de fé. Os factos sobre os quais esta fé deve ser baseada simplesmente são afirmados.
Parece haver um padrão para estes seis dias da criação, como muitos estudantes da Bíblia têm observado. Pode ser melhor ilustrado da seguinte forma:
O Sem Forma Transformado em Forma – o sem forma e vazia introduz a ação criadora de Deus, pondo ordem no caos inicial. Tanto que a palavra imediata é “mas”. Uma contraposição. Deus vai fazer algo com o caos. “O Espírito de Deus pairava sobre a face das águas” – No primeiro dia (vs. 3-5) Deus traz a luz. Ele fala “haja luz” e passa a haver luz. É a sua Palavra que cria, que trás as coisas à existência. O universo não é autoexame, nem a matéria é eterna. Houve um momento em que um Ser Todo-Poderoso, Inteligente e Majestoso, trouxe à luz o que não havia.
A relação entre a luz de Deus e o Sol tem seu princípio já no relato da criação, no primeiro capítulo de Génesis, quando a luz é criada bem antes do Sol. A luz precede o surgimento do Sol. Da mesma forma, sobrevive a ele, como podemos ver em Apocalipse 22:5. No entanto não se pode dizer que a luz foi criada, mas que surgiu no primeiro dia. Dentro desse contexto, podemos deduzir que a Luz de Deus precede o Sol, que é uma figura de Cristo. Assim, compreendemos que mesmo sem conhecermos a Cristo, somos dEle conhecidos; mesmo num mundo em trevas, Deus sempre zelou pelos seus escolhidos; ao povo que caminhava na noite, Deus enviou uma coluna de fogo para aquecê-lo e iluminá-lo; mesmo antes de qualquer um de nós experimentarmos a acolhida no aprisco de Cristo, Deus já nos cuidava e nos atraia ainda que não o víssemos, nem o sentíssemos.
No Antigo Testamento a luz é símbolo de vida e bênção. Leia 2 Samuel 22:29 e Salmos 49:19: 56:13; 97:11 e 112:4. A primeira palavra criadora de Deus traz a luz para o meio das trevas do caos. É o início da vida. Começa a organização do mundo. Que sábio arquiteto!
No segundo dia (vs. 6-8) Deus traz o firmamento (Atmosfera espaço superior). Surge a abobada celeste, com separação entre as águas (Água espaço inferior) de cima e as debaixo. Uma linguagem atual seria a de vapores subindo e clareando a superfície do oceano. As águas são separadas e distinguidas. As águas dos oceanos evaporam-se para formar as nuvens e se transformarem em águas doces. O sábio construtor começa a tomar providências para que aja vida na terra. Sem água potável ela seria impossível.
No terceiro dia (vs. 9-13) - Plantas terrestres. Já existia a água potável. Começara a vida vegetal na terra. A ordem divina é para que a terra apareça, ajuntando-se as águas em um só lugar. Tudo está coberto de água, mas a terra emergirá. 2 Pedro 3:5 diz bem que a terra “foi tirada da água”. A ideia é que toda a superfície da terra se juntou num só lugar. Hoje, muitos geólogos defendem a ideia de que, originariamente, toda a terra firme formava um só continente, ilustram, inclusive, com a configuração da América do Sul e da África, que seriam encaixáveis uma na outra.
A terra produz relva. Erva que dá sementes e árvores. Cada uma de acordo com a sua espécie, cada uma com condições de se reproduzir. A vida se acelerará. A autorreprodução é marca de aceleração da vida.
No quarto dia (vs.14-19), temos o surgimento dos “dois grande luminares” cujos nomes, Sol e Lua, são propositadamente omitidos. Os hebreus habitavam em região dominada pelo culto aos astros. O relato além de mostrá-los como criação, omite os seus nomes. Mais importante do que eles é o facto de que alguém os fez. Não se diz que eles foram criados no quarto dia. Eles o foram no primeiro dia. Agora, surgem. Agora com a terra arrefecida, há menos vapor, são mais visíveis. A terra passa a ser aquecida por fora. Com o sol vêm o calor e as estações. Começa a contagem do tempo pelos astros: “para dias e anos” (v. 14). Tudo está preparado para a vida animal. Há água, comida e o ciclo das estações.
No quinto dia (vs. 20-23) as água passaram a ter a vida animal (Peixes e Pássaros). Há vida na água “abundantemente”. Deus criou grandes animais marinhos e tudo o que se move nas águas. Criou peixes e aves, e viu que tudo era bom, e os abençoou dizendo: “Sejam frutíferos e se reproduzam”. O verbo usado significa “fervilhar”. A ideia é de uma reprodução em grande escala. A gramínea já produz sementes que estas comem. Fica bem claro que a vida animal e humana são obra muito bem cuidada de Deus. E a tarde e a manhã foram o quinto dia.
No sexto dia (v. 24-31), temos a criação da vida réptil e da mamífera, animal e humana. Deus disse: “Que a terra se encha de criaturas vivas”. Então ele criou os animais da terra, o gado e tudo que rasteja, para se reproduzirem; e Deus viu que isso era bom.
Produza a terra seres viventes. “Seres é o hebraico nêfêsh, termo rico que significa “garganta, respiração, fôlego, ser pessoa, gente, personalidade, individualidade, vida, alma”, ou seja, algo que respira. Mas, secundariamente, também “pessoa morta, cadáver”. Por isso os “viventes”. A vida animal se estabelece. Há animais domésticos, répteis e animais selvagens, de acordo com as suas espécies. A palavra utilizada para répteis não significa uma classificação científica exclusiva de répteis. Alude ao movimento suave ou o rastejar e arrastar de várias espécies de criatura.
Deus provou o seu próprio trabalho. Não o fez descuidadamente, mas como um artesão que, com muito cuidado, executa sua tarefa. O mundo é bom. Teve um grande construtor que elogiou a sua própria obra. É tudo bom que, no último dia, o sexto, Deus se permitiu um superlativo: “muito bom” (1:31). Precisamos de ver a terra como o bom mundo de Deus. Não é um mundo descuidado, sem organização. Muitas vezes nós estragamos a boa criação divina, com uma administração caótica, mas que ela é fantástica, não se pode negar. Deus é o sujeito de tudo. E a sua palavra comanda tudo. A história da Criação começa com uma palavra sua: “Disse Deus” (1:3).
Deus preparou primeiro o cenário para depois trazer o actor principal, o homem. Cada dia recebeu um “bom” como aprovação divina, mas o dia em que o homem foi criado recebeu um “muito bom”. O homem é o que Deus tem de mais importante na face da terra. Tanto que quando o homem se perdeu, desviando-se de Deus, este enviou o seu Filho para salvá-lo.
Vendo desta maneira, os três primeiros dias cuidam da situação “sem forma” descrita em Génesis 1:2. Os dias 4 a 6 tratam do estado de “vácuo” ou “vazio” do verso 2. Parece haver também uma correlação entre os dias 1 e 4, 2 e 5 e 3 e 6. Por exemplo, a atmosfera e a água recebem a forma de vida correspondente de pássaros e peixes, como se isto não devesse estar tão longe.
Duas outras observações devem ser feitas. Primeiro, há uma sequência nos seis dias. Fica claro que este relato está disposto cronologicamente, cada dia edificado sobre a atividade criativa dos dias anteriores. Segundo, há um processo envolvido na criação, um processo envolvendo a transformação do caos no cosmos, a desordem na ordem.
Enquanto Deus poderia ter instantaneamente criado a terra tal como ela é, Ele não escolheu fazer assim. A clara impressão dada pelo texto é que este processo levou seis dias literalmente, e não longas eras. No entanto, o Deus eterno não está tão preocupado em fazer as coisas instantaneamente quanto nós estamos. O processo de santificação é apenas mais um dos muitos exemplos da atividade progressiva de Deus no mundo.
O Significado da Criação para os Antigos Israelitas
Antes de examinarmos a questão do que a criação deve significar para nós, devemos tratar do seu significado para aqueles que primeiramente leram estas palavras inspiradas da pena de Moisés. O propósito inicial deste relato foi para os Israelitas dos dias de Moisés. O que devem ter aprendido? Como devem ter reagido?
(1) O relato da criação de Génesis foi uma correção à cosmogonia corrompida de seus dias. Já dissemos que o Egito, por exemplo, acreditava em múltiplos deuses da natureza. Precisamos de reconhecer que Israel, devido à sua proximidade e contato prolongado com os egípcios, não deixou de ser afetado por seus pontos de vista religiosos. “Agora, pois, temei ao Senhor e servi-o com integridade e com fidelidade; deitai fora os deuses aos quais serviram vossos pais dalém do Eufrates e servi ao Senhor” (Js. 24:14).
Não era suficiente honrar a Yahweh simplesmente como um deus, um entre muitos. Nem poderia ser concebido isso do Deus de Israel. Só Yahweh é Deus. Não há outro Deus. Ele é o criador dos céus e da terra. Ele não é simplesmente superior aos deuses das nações ao derredor. Somente Ele é Deus.
A tendência em se começar a confundir Deus com a Sua criação foi uma parte dos pensamentos do mundo antigo. Ele deve ser honrado como o Deus da criação, não apenas Deus na criação. Todas as tentativas de se visualizar ou humanizar a Deus na forma de alguma coisa criada foram tendências em equiparar Deus com a Sua criação. Creio que foi assim com o bezerro de ouro de Arão.
(2) O relato da criação descreve o caráter e os atributos de Deus. Negativamente, Génesis 1 corrige muitas concepções populares erradas a respeito de Deus. Positivamente, retrata Seu caráter e Seus atributos.
Deus é soberano e Todo-Poderoso. Distintamente das cosmogonias de outros povos antigos, não há nenhuma batalha na criação descrita em Génesis 1. Deus não enfrentou forças opostas para criar a terra e o homem. Deus criou com uma simples ordem “Haja...” Há ordem e progresso. Deus não faz experiência, mas, ao invés disso, habilmente molda a criação conforme Seu projeto onisciente.
Deus não é simplesmente energia, mas uma Pessoa. Ainda que devamos ficar atemorizados pela transcendência de Deus, devemos ficar também pela Sua imanência. Ele não é uma energia cósmica distante, mas um Deus pessoal sempre presente. Isto é refletido no facto de que Ele criou o homem à sua própria imagem (1:26-28). O homem é um reflexo de Deus. Nossa personalidade é simplesmente uma sombra da personalidade de Deus. No capítulo 2 Deus deu a Adão uma tarefa significativa, com uma companheira como auxiliadora. No terceiro capítulo aprendemos que Deus tinha comunhão diária com o homem no jardim (cf. 3:8).
Deus é eterno. A palavra eterno significa “perpétuo, sem começo e sem fim”. Enquanto que as outras criações são vagas ou errôneas no que concerne à origem de seus deuses, o Deus de Génesis é eterno. O relato da criação descreve Sua atividade no princípio dos tempos (do ponto de vista humano). O Salmo 90:2 nos diz sobre a eternidade de Deus: “"Antes de nascerem os montes e de criares a terra e o mundo, de eternidade a eternidade tu és Deus”. A duração que se estende sem limite ao passado e a duração sem limite ao futuro, de tempos eternos a tempos eternos, Deus foi e será para sempre.
Deus é bom. A criação não teve lugar num vácuo moral. A moralidade foi tecida dentro da estrutura da criação. Repetidamente é encontrada a expressão “e era bom”. Bom implica não somente em utilidade e complexidade, mas em valores morais. Aqueles que sustentam pontos de vista ateístas sobre a origem da terra não veem nenhum outro sistema de valores a não ser o que é sustentado pela maioria das pessoas. A bondade de Deus é refletida em Sua criação, a qual, em seu estado original, era boa. Mesmo hoje, a graça e a bondade de Deus são evidentes (cf. Mt. 5:45; At. 17:22-31).
O significado da Criação Para Todos os Homens
O tema de Deus como Criador é relevante através de toda a Escritura. É significativo que as últimas palavras da Bíblia sejam notadamente similares às primeiras.
Então me mostrou o rio da água da vida, brilhante como cristal, que sai do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da sua praça, de uma e outra margem do rio, está a árvore da vida, que produz doze frutos, dando o seu fruto de mês em mês, e as folhas da árvore são par a cura dos povos. Nunca mais haverá qualquer maldição. Nela, estará o trono de Deus e do Cordeiro. Os seus servos o servirão, contemplarão a sua face, e na sua fronte está o nome dele. Então, já não haverá noite, nem precisam eles de luz de candeia, nem da luz do sol, porque o Senhor Deus brilhará sobre eles e reinarão pelos séculos dos séculos” (Ap. 22:1-5).
A verdade de que Deus é o Criador dos céus e da terra não é simplesmente algo para se acreditar, mas algo a que devemos reagir. Deixe-me mencionar apenas umas poucas implicações do ensinamento de Génesis 1.
(1) Os homens devem se submeter ao Deus da criação em temor e obediência. Os céus proclamam a glória de Deus: “Os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras de suas mãos. Um dia discursa a outro dia, e uma noite revela conhecimento a outra noite” (Sl. 19:1-2). A voz de Deus sempre está falando. Suas testemunhas dão testemunho de sua glória, majestade e graça criativa. O universo grita com alegria que, atrás da sua beleza e poder está o Único que deu vida e propósito para tudo que existe.
Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato” (Rm. 1:20-21).
Os homens devem temer o Deus Todo-Poderoso da criação:
Os céus por sua palavra se fizeram e, pelo sopro de sua boca, o exército deles. Ele ajunta em montão as águas do mar; e em reservatório encerra as grandes vagas. Tema ao Senhor toda a terra, temam-nos todos os habitantes do mundo. Pois ele falou e tudo se fez, ele ordenou e tudo passou a existir” (Sl. 33:6-9).
A grandeza de Deus é evidente nas obras de suas mãos - a criação que está ao nosso redor. Os homens deveriam temê-Lo e reverenciá-Lo por Quem Ele é.
Bendize, ó minha alma, ao Senhor! Senhor, Deus meu, como tu és magnificente, sobrevestido de glória e majestade, coberto de luz como de um manto. Tu estendes o céu como uma cortina, pões nas águas o vigamento da tua morada, tomas as nuvens por teu carro, e voas nas asas do vento. Fazes a teus anjos ventos e a teus ministros, labaredas de fogo. Lançaste os fundamentos da terra, para que ela não vacile em tempo nenhum. Tomaste o abismo por vestuário e a cobriste; as águas ficaram acima das montanhas; à tua repreensão, fugiram, à voz do teu trovão, bateram em retirada. Elevaram-se os montes, desceram os vales, até ao lugar que lhes havias preparado. Puseste às águas divisa, que não ultrapassarão, para que não tornem a cobrir a terra” (Sl. 104:1-9).
(2) Os homens devem confiar no Deus da criação, para prover todas as suas necessidades. A Providência Divina é paternal. Deste modo percebe-se que a Providência Divina tem um fim escatológico particular e universal: diz respeito a cada indivíduo e a toda a humanidade, mesmo que alguns, mediante a liberdade que possuem, resistam a esse amparo oferecido por Deus.
Após voltar Abrão de ferir a Quedorlaomer e aos reis que estavam com ele, saiu-lhe ao encontro o rei de Sodoma no vale de Savé, que é o vale do rei. Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; era sacerdote do Deus Altíssimo: abençoou ele a Abrão, e disse: Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo; que possui os céus e a terra; e bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus adversários nas tuas mãos. E de tudo lhe deu Abrão o dízimo. Então disse o rei de Sodoma a Abrão: dá-me as pessoas, e os bens fiquem contigo. Mas Abrão lhe respondeu: Levanto minha mão ao Senhor, o Deus Altíssimo, que possui o céu e a terra, e juro que nada tomarei de tudo o que te pertence, nem um fio, nem uma correia de sandália, para que não digas: Eu enriqueci a Abrão; nada quero para mim, senão o que os rapazes comeram, e a parte que toca aos homens Aner, Escol e Manre, que foram comigo; estes que tomem o seu quinhão” (Gn. 14:17-24).
Abrão deu o dízimo a Melquisedeque com base em sua confissão de que o Deus de Abrão era “o Deus Altíssimo, que possui os céus e a terra” (vs. 19, 20). E mesmo enquanto Abrão dava o dízimo a Melquisedeque, ele se recusou a se beneficiar em qualquer aspecto financeiro do rei pagão de Sodoma, pois queria que este homem soubesse que “o Deus Altíssimo, que possui os céus e a terra” foi o Único que o fez prosperar.
Nós cantamos “Ele é o dono do gado em milhares de montes... sei que ele se importará comigo.” Que boa teologia. O Deus que é o nosso Criador, é também o nosso Sustentador. Veja que Deus não concluiu o universo e então o deixou entregue a si mesmo, tal como parecem dizer. Deus mantém um cuidado contínuo sobre Sua criação. A “Providência” é o desígnio de divino que, com sabedoria e liberdade, conduz os seres criados, no hoje da criatura. Deste modo, a Providência é certa e infalível e cabe a ela o governo e a conservação do mundo.
Fazes crescer a relva para os animais, e as plantas para o serviço do homem, de sorte que da terra tire o seu pão; o vinho, que alegra o coração do homem, o azeite que lhe dá brilho ao rosto, e o pão que lhe sustém as forças. Avigoram-se as aves do Senhor, e os cedros do Líbano que ele plantou, em que as aves fazem seus ninhos; quanto à cegonha, a sua casa é nos ciprestes. Os altos montes são das cabras montesinhas, e as rochas o refúgio dos arganazes. Fez a lua para marcar o tempo; o sol conhece a hora do seu ocaso. Dispões as trevas, e vem a noite, na qual vagueiam os animais da selva. Os leõezinhos rugem pela presa, e buscam de Deus o sustento; em vindo o sol, eles se recolhem e se acomodam nos seus covis. Sai o homem para o seu trabalho, e para o seu encargo até a tarde” (Sl. 104:14-23)
O Novo Testamento dá um passo além ao nos informar que o Filho de Deus foi o Criador e continua a servir como Sustentador da criação, mantendo todas as coisas juntas:
Pois nele foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele tudo subsiste” (Cl. 1:16-17).
(3) Os homens devem se humilhar diante da sabedoria de Deus evidenciada na criação. Jó sofreu muitas aflições. Mas, afinal, o suficiente foi suficiente. Ele começou a questionar a sabedoria de Deus em sua adversidade. Ao seu questionamento Deus respondeu:
Depois disto o Senhor, do meio de um redemoinho, respondeu a Jó: Quem é este que escurece os meus desígnios com palavras sem conhecimento? Cinge, pois, os teus lombos como homem, pois eu te perguntarei, e tu me farás saber. Onde estavas tu, quando eu lançava os fundamentos da terra? Diz-mo, se tens entendimento. Quem lhe pôs as medidas, se é que o sabes? Ou quem estendeu sobre ela o cordel? Sobre que estão fundadas as tuas bases, ou quem lhe assentou a pedra angular, quando juntas as estrelas da alva alegremente cantavam, e rejubilavam todos os filhos de Deus” (Jó 38:1-7)?
Jó foi desafiado a sondar a sabedoria de Deus na criação. Ele não podia explicá-la ou compreendê-la, quanto mais contestá-la. Como, então, Jó poderia questionar a sabedoria da obra de Deus em sua vida. Na verdade, ele não podia ver o propósito de tudo aquilo, mas sua perspectiva não era a de Deus. Deixe que, quem quer que questione a ação de Deus em sua vida contemple a infinita sabedoria de Deus como é vista na criação, e então seja silenciado e espere Nele para fazer o que é certo.
Se o homem pudesse escolher refletir sobre qualquer questão, deixe-o tentar sondar a razão pela qual um Deus infinito deveria Se preocupar tanto com um simples homem:
Quanto contemplo os teus céus, obra dos teus dedos, e a lua e as estrelas que estabeleceste, que é o homem, que dele te lembres? E o filho do homem, que o visites? Fizeste-o, no entanto, por um pouco, menor do que Deus, e de glória e de honra o coroaste” (Sl. 8:3-5).
(4) O homem deve encontrar conforto nos braços de Deus em tempos de perigo e dificuldade, sabendo que o seu Criador é capaz e deseja de livrá-lo.
Por isso também os que sofrem segundo a vontade de Deus encomendem as suas almas ao fiel Criador, na prática do bem” (I Pe. 4:19).
Por que, pois, dizes, ó Jacó, e falas, ó Israel: O meu caminho está encoberto ao Senhor, e o meu direito passa despercebido ao meu Deus? Não sabes, não ouviste que o eterno Deus, o Senhor, o Criador dos fins da terra, nem se cansa nem se fatiga? Não se pode esquadrinhar o seu entendimento. Faz forte ao cansado, e multiplica as forças ao que não tem nenhum vigor. Os jovens se cansam e se fatigam, e os moços de exaustos caem, mas os que esperam no Senhor renovam as suas forças, sobem com asas como águias, correm e não se cansam, caminham e não se fatigam” (Is. 40:27-31).
Assim Deus, o Senhor, que criou os céus e os estendeu, formou a terra, e a tudo quanto produz; que dá fôlego de vida ao povo que nela está, e o espírito aos que andam nela. Eu, o Senhor, te chamei em justiça, tomar-te-ei pela mão, e te guardarei, e te farei mediador da aliança com o povo, e luz para os gentios” (Is. 42:5-6).
Eu sou o Senhor, e não há outro; além de mim não há Deus; eu te cingirei, ainda que não me conheces. Para que se saiba até ao nascente do sol e até ao poente, que além de mim não há outro; eu sou o Senhor, e não há outro. Eu formo a luz, e crio as trevas; faço a paz e crio o mal; eu o Senhor, faço todas estas cousas” (Is. 45:5-7).
(5) O homem deve responder ao Deus da criação com o louvor que Lhe é devido: “A glória do Senhor seja para sempre! Exulte o Senhor por suas obras! Com só olhar para a terra ele a faz tremer; toca as montanhas, e elas fumegam. Cantarei ao Senhor enquanto eu viver; cantarei louvores ao meu Deus durante a minha vida. Seja-lhe agradável a minha meditação; eu me alegrarei no Senhor. Desapareçam da terra os pecadores, e já não subsistam os perversos. Bendize, ó minha alma, ao Senhor! Aleluia” (Sl. 104:31-35)!
Aleluia! Louvai ao Senhor do alto dos céus, louvai-o nas alturas. Louvai-o todos os seus anjos; louvai-o todas as suas legiões celestes. Louvai-o, sol e lua; louvai-o todas as estrelas luzentes. Louvai-o, céus dos céus, e as águas que estão acima do firmamento. Louvem o nome do Senhor, pois mandou ele e foram criados. E os estabeleceu para todo o sempre: fixou-lhes uma ordem que não passará” (Sl. 148:1-6).
Vinde, adoremos e prostremo-nos; ajoelhemos diante do Senhor que nos criou” (Sl. 95:6).
Ó Senhor, Senhor nosso, quão magnífico em toda a terra é o teu nome! Pois expuseste nos céus a tua majestade” (Sl. 8:1).
Conclusão
Meu amigo, o ensinamento de Génesis 1 é uma grande e poderosa verdade. É o único que exige mais do que aceitação; ele precisa de ação. E mesmo assim, por maior que seja, é empalidecido pela vinda de Jesus Cristo. Da mesma forma que Deus proclamou: haja luz, assim Deus de uma vez por todas falou nos últimos tempos pelo Filho (Hb.1:1-2), que é a luz:
Porque Deus que disse: De trevas resplandecerá luz – ele mesmo resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Cristo” (2 Co. 4:6).
No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem ele nada do que foi feito se fez. A vida estava nele, e a vida era a luz dos homens. A luz resplandece nas trevas, e as trevas não prevaleceram contra ela” (Jo. 1:1-5).
A saber: a verdadeira luz que, vinda ao mundo, ilumina a todo homem. Estava no mundo, o mundo foi feito por intermédio dele, mas o mundo não o conheceu. Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus; a saber, aos que creem no seu nome; os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus” (Jo.1:9-13).
Enquanto Deus Se revelou palidamente na criação, Ele Se revelou completamente em Seu Filho: “Ninguém jamais viu a Deus: o Deus unigénito, que está no sei do Pai, é quem o revelou” (Jo. 1:18).
Não podemos evitar a revelação bíblica de que o Deus que criou os céus e a terra, o Deus que redimiu os Israelitas do Egito, é o Deus-Homem da Galileia, Jesus Cristo. Da mesma forma como Ele fez a primeira criação (Cl. 1:16), agora Ele vem realizar uma nova criação, através de Sua obra na cruz do Calvário: “E assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura: as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas.” (2 Co. 5:17)
Além disto, breve virá o dia em que os céus e a terra serão purificados dos efeitos do pecado e serão novos céus e nova terra: “Virá, entretanto, como ladrão, o dia do Senhor, no qual os céus passarão com estrepitoso estrondo e os elementos se desfarão abrasados; também a terra e as obras que nela existem serão atingidas. Visto que todas estas coisas hão-de ser assim desfeitas, deveis ser tais como os que vivem em santo procedimento e piedade, esperando e apressando a vinda do dia de Deus, por causa do qual os céus incendiados serão desfeitos e os elementos abrasados se derreterão. Nós, porém, segundo a sua promessa, esperamos novos céus e nova terra, nos quais habita justiça” (2 Pe. 3:10-13)
Você está pronto para esse dia, meu amigo? Já é uma nova criatura em Cristo? Génesis 1 revela como Deus tomou o caos e o transformou no cosmos – belo e ordenado. Se ainda não veio a Cristo, posso dizer com toda segurança que a sua vida é sem forma e vazia, é caótica e sem vida. O mesmo que tornou o caos em cosmos pode fazer de sua vida uma nova vida.
É na grandeza da criação e na prática da justiça que Deus revela a sua presença. É imitando Deus pela prática da justiça que o ser humano ajuda a manter a criação de Deus.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Jonas, o Profeta Escolhido Pelo Senhor

Leitura: Jonas 1-4
Introdução
Todos os outros livros proféticos apresentam mensagens de Javé a Israel por intermédio de um profeta. O livro de Jonas é singular por ser um relato do que ocorreu a um profeta, não uma coletânea de suas mensagens. Uma vez que esse livro foi colocado no cânon entre os profetas, podemos concluir que a história das experiências e reações de Jonas é a mensagem. E a história envolve muito mais do que ser engolido por um peixe.
Ao estudar o livro de Jonas, que diz muito sobre a soberania de Deus, que fala de maneira explícita e implícita, e nos ensina alguns conceitos valiosos sobre a soberania de Deus, percebemos que fora escrito com o propósito de lembrar o alto valor da pregação missionária e de lembrar que o conflito entre a vontade humana e a vontade divina é o foco do livro, tal como o é em toda a Bíblia. Muitas vezes estas duas vontades opõem-se. Quando o homem escolhe fazer a sua vontade em vez de seguir a vontade divina encontra sempre problemas. Portanto, é bom que aprendamos estas lições e nos lembremos delas para que possamos manter o relacionamento certo com nosso Criador. Deus não quer que ninguém se perca, mas deseja que todos venham ao arrependimento (2 Pd. 3:9).
A vontade divina, no Antigo Testamento, era transmitida aos homens pela Lei escrita, mais principalmente pelos profetas. A principal função do profeta era comunicar ao povo a vontade do Senhor. A responsabilidade dos profetas do antigo Testamento não era principalmente a de predizer o futuro no sentido moderno da palavra “profetizar”, era mais a de anunciar a vontade de Deus que Ele comunicara através da revelação, a de serviram como canais de comunicação entre Deus e o seu povo, conscientizando-o acerca da vontade e do conhecimento divinos. Na Nova Aliança, continua a ser a Palavra escrita a indicar-nos a vontade do Senhor, em ligação ao Espírito Santo que habita em cada nascido-de-novo (Hb. 1:1-2).
A historicidade do livro de Jonas se comprova com 2 Reis 14:25 e pela referência a Jonas feita pelo próprio Senhor Jesus em Mateus 12:39-41. Pelas características, o livro é de autoria do próprio Jonas que, à semelhança de Moisés, relata os acontecimentos com minúcias, procurando a glória de Deus e não a sua. Seu livro difere consideravelmente dos outros livros proféticos do Antigo Testamento, visto que é inteiramente composto de narrativa.
Jonas, cujo nome significa “pomba”, Nascido em Gate-Hefer, perto de Nazaré e, portanto, era galileu, bem como Naum, Malaquias e Jesus, que profetizou no Reino do Norte durante a época de Jeroboão II, rei de Israel, no séc. VIII a.C. e que predisse a expansão territorial conseguida por esse soberano (2 Rs. 14:25-27), foi chamado para pregar a Palavra de Deus em Nínive. Mas, ele procura fugir, embarcando para Társis, um lugar bem distante, onde, conforme se acreditava, Javé não estava. Diante desta reação, Javé provoca uma forte tempestade. No navio, os marinheiros estrangeiros trabalham duramente para sobreviver ao temporal e, enquanto isso, Jonas, membro do povo de Israel, dorme profundamente no porão. Ao ser questionado pelos marinheiros, o próprio Jonas pede que seja atirado ao mar para aplacar a ira de Javé. Se morrer, não terá de assumir a ordem de Javé. Mas um grande peixe, por ordem da divindade, engole-o e, após três dias, vomita-o em terra firme. Nas entranhas do peixe, Jonas ora. Novamente, Jonas recebe a ordem de ir a Nínive e, desta vez, obedece. Ele vai e anuncia a destruição da cidade. Todos os habitantes se convertem: homens, mulheres, rei e animais. Deus se compadece, e Jonas fica indignado com a atitude misericordiosa de Javé.
A história de Jonas é muito conhecida, e uma das cenas preferidas é a de Jonas engolido por um peixe e sua permanência por três dias e três noites (Jn. 2:1-2:11). As primeiras comunidades cristãs também conheciam esta história, e volta e meia ela era relembrada. No evangelho de Mateus, lemos: “Como Jonas esteve no ventre do monstro marinho por três dias e três noites, assim ficará o Filho do Homem três dias e três noites no seio da terra” (Mt. 12:40). A conversão dos habitantes de Nínive é citada como modelo e censura para Israel (Mt. 12:41-42; Lc. 11:32).
A fuga de Jonas não é diferente da atitude de muitos hoje. Esse comportamento de fugir de Deus não aconteceu somente com Jonas, mas também ocorre com muitas pessoas. Podemos traçar um paralelo entre as razões da fuga de Jonas e de suas consequências com alguns dos motivos pelos quais os filhos de Deus fogem aos propósitos Dele nos dias atuais, assim como, as consequências que essas fugas trazem. Israel se tinha afastado muito de seu chamado missionário original, pois deveria estar sendo uma luz de redenção para os povos (Gn. 12:1-3; Is. 49:6. Este livro é um sério apelo para a ação evangelística e missionária da Igreja, que foi chamada para proclamar a palavra.
I - O Mundo Clama Por Profetas (1:1-2:10)
Os tempos são difíceis. A nossa cidade, o nosso país e o mundo clamam por pessoas que estejam dispostas a anunciar a Palavra e Deus quer levantar pregadores. Foi isso que ocorreu com Jonas. Urge que o povo se mobilize. Não dá para virar o rosto como os religiosos da Parábola do Bom Samaritano. Contudo, faltam profetas!
Precisamos de profetas que pela transformação do seu carácter e do ensino acerca da misericórdia divina, com obediência incondicional e conhecedores de que o amor de Deus se estende a todos os homens, forneçam conteúdos éticos à consciência política e ao tecido social; que sejam capazes de encarar até a autoridade máxima da nação para defenderem viúvas pobres; que amargam a pobreza para denunciar desvios morais entre o povo. Precisamos de profetas que mostrem a impotência dos rituais religiosos para mudar realidades; que tenham a coragem de Isaías para proclamar: “Parem de trazer ofertas inúteis… Não consigo suportar vossas assembleias cheias de iniquidade… Quando estenderem as mãos em oração, esconderei de vós os meus olhos; mesmo que multipliquem as vossas orações, não as escutarei” (Is. 1:13)!
Precisamos de profetas que sintam as dores divinas, que percebam que a história está descambando, que sofrem, indignados com a banalização da vida e com a morte desnecessária de inocentes, que mais do que porta-vozes do além, encarnam o coração paterno de Deus, colocando-se na brecha, com o dedo em riste, saiam do palácio para clamar no deserto, mesmo sabendo que não serão ouvidos, insistem em prenunciar os despenhadeiros que a falta de amor abre, avisando que o jejum que Deus quer não é abstinência de comida, mas o esforço para se restabelecer a justiça: “Será esse jejum que escolhi, que apenas um dia o homem se humilhe, incline a cabeça como o junco e se deite sobre pano de saco e cinza? É isso que vós chamais de jejum, um dia aceitável ao Senhor? O jejum que desejo não é este: soltar as correntes da injustiça, desatar as cordas do jugo, pôr em liberdade os oprimidos e romper todo o jugo? Não é partilhar sua comida com o faminto, abrigar o pobre desamparado, vestir o nu que encontrou, e não recusar ajuda ao próximo” (Is. 58:5-7)?
Precisamos de profetas que não fujam da picada das dificuldades; que as suas palavras sejam martelos que despedaçam os corações de pedra; que de seus olhos saiam faíscas do fogo consumidor da justiça; que como moscas atrapalham a sala do perfumista corrupto. O país carece de homens que não tenham preço. É necessário surgirem profetas que, a exemplo de Micaias, não permitam que seus nomes constem na folha de pagamento dos poderosos. Josafá, rei de Judá, desejou firmar uma aliança com o rei de Israel, mas antes procurou consultar a Deus. Acabe tinha cerca de 400 profetas assalariados. Josafá se intrigou com a unanimidade e pediu para se aconselhar com alguém independente. Havia Micaías, que estava preso. Ao buscá-lo, o mensageiro advertiu: “Veja, todos os outros profetas estão predizendo que o rei terá sucesso. Sua palavra também deve ser favorável”. Micaías, porém, respondeu: “Juro pelo nome do Senhor que direi o que o Senhor me mandar” (1 Rs. 22).
Precisamos de profetas que não alicercem seus ministérios em blefes do jogo do poder, em dar um ar de status, um ar de poder, de acesso privilegiado ao sobrenatural, em manifestações sobrenaturais de sinais, mas que estejam contentes de poderem transmitir a verdade de Jesus. Que sejam como João Batista, pois nenhum milagre se fez por intermédio dele, mas tudo o que ensinou a respeito de Jesus era verdade (Jo. 10:14). Quem dera se mais homens falassem como Paulo: “Os judeus pedem sinais miraculosos, e os gregos procuram sabedoria, nós, porém, pregamos a Cristo crucificado, o qual, de facto, é escândalo para os judeus e loucura para os gentios, mas para os que foram chamados, tanto judeus como gregos, Cristo é o poder de Deus e a sabedoria de Deus” (1 Co. 1:22).
Precisamos de profetas que sejam sentinelas nas muralhas que protegem as cidades, bússulas na incipiente ética primitiva, faróis da esperança futura; que saibam lamentar como Jeremias e chorem porque o processo de evangelização no país priorizou salvar almas e não pessoas; prometeu o céu, mas descuidou em gerar ações transformadoras da história, gastou recursos financeiros em proveito da própria instituição e desperdiçou oportunidades de ser referência ética. O país precisa de mais profetas chorões. Só eles saberão fazer a espiritualidade ser mais solidária com os miseráveis da terra.
 Precisamos de profetas que sabe escutar e atender o chamado de Deus para a vida; que sentem as dores de Deus ao olhar para os seus filhos que se estão perdendo; que se deparam com o mundo e choram ao ver o rumo maldito que as coisas estão tomando; que compreendem e vivem a plenitude do amor divino e, por isso, “não se conformam com esse século”; que protestam onde e a quem for preciso, denunciando tudo o que se opõe à vida sem temer, dotadom da força e coragem do Reino, afrontam o rei, imperador, sacerdote, presidente, deputado, papa, pastor, a sociedade inteira se for preciso, dispostos a andar na contramão se for este o caminho que aponta para a vida e justiça, guiados pelo amor.
Precisamos de profetas que sempre clamam ainda que ninguém os ouça, ainda que ameaçados, tachados de loucos e deixados de lado; que estando sozinhos, falam e agem mesmo assim, porque mesmo que o povo os rejeite, o sistema religioso os condene e os persiga, Deus está com eles. Precisamos de profetas que se esqueçam de si próprios e enfrentem a peleja apesar das circunstâncias, mesmo sabendo que, provavelmente, só quando estiverem mortos dirão: “eles tinha razão”.
Precisamos de profetas que sejam como chama de esperança para os homens, como porta-vozes do Reino e do amor de Deus para a sua criação. Num mundo como o de hoje, onde os valores são trocados e a religião corrompida, um mundo de relacionamentos falidos, de homens sozinhos, os profetas são fundamentais. Deus já o tem chamado há muito tempo para esse ofício? Se ainda não ouviu a Sua voz, o momento chegará.
Os dias são difíceis. Oremos para que se levantem pregoeiros da justiça antes que as pedras comecem a clamar. Sem eles, Deus não fala, o futuro inexiste, toda a perspectiva se esgarça e o inferno se viabiliza. Nunca se precisou tanto deles, principalmente, agora, nesse protestantismo cooptado pelo mercado e instrumentalizado pela ganância.
O profeta toma para si o problema dos outros, assume a responsabilidade do mundo. Quando tudo diz morte, o profeta clama vida; quando tudo diz individualismo, soberba e ganância, o profeta brada comunhão e partir do pão; quando todos dizem lei, o profeta diz amor. O profeta é apaixonado. Apaixonado por Deus, apaixonado pela vida.
a) O chamado (1:1-2). Jonas ben Amitai foi um profeta que predisse a expansão do reino do norte no reinado de Jeroboão II, por volta de 780 a.C. (2 Rs.14:25). O livro de Jonas nada nos fala de sua atividade profética em Israel. Simplesmente começa com a ordem de Javé para que profetize contra a perversa Nínive. Em vez de ir para leste, rumo à Assíria, Jonas embarcou num navio para Társis – em direção oposta, para longe da presença do Senhor (v. 3), o mais longe que a mente da época conseguia imaginar.
A vontade humana é simbolizada no livro de Jonas por Társis, pois era a vontade do profeta a sobrepor-se. Jonas, ao invés de obedecer, indo para Nínive, decide fugir para o lugar mais distante, então conhecido, isto é, a cidade de Társis, localizada ao sul da Península Ibérica. A ida para Társis foi iniciativa humana e contrária à ordem do Senhor.
Na Bíblia, normalmente, os profetas são pessoas obedientes e exemplares. Contudo isto não aconteceu no caso de Jonas: “Os profetas não eram meros autómatos, pois tinham poder de resistir à vontade de Deus. Todavia, este é o único caso de que se tem notícia de um profeta que se recusou a levar a cabo a sua comissão”.
A vontade do Senhor para o mundo é a salvação de toda a humanidade: “...o qual deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade” (I Tm. 2:4). A vontade divina para o homem como colectividade é simbolizada no livro de Jonas por Ninive, uma grande cidade, capital da Assíria, nas margens do rio Tigre, com uma população de mais de 120 mil pessoas (Jn. 4:11), conhecida pela sua corrupção, pela sua maldade que incluía a idolatria e a extrema brutalidade contra os prisioneiros de guerra além de forte imoralidade (1:2). A ordem acerca da ida do profeta para levar a Palavra à cidade reflecte uma preocupação pelo colectivo, pois Jonas não foi enviado a uma pessoa única, como aconteceu a outros profetas (por exemplo: Elias e a viúva de Sarepta em I Rs. 17). Esta é uma cidade pagã, inimiga de Israel. No entanto, o desejo de salvação universal é claramente manifesto pela ordem (“Levanta-te”) dada a Jonas para pregar ali o arrependimento (Jn. 1:2).
b) Um missionário desobediente – Fugindo de Deus e do Dever (1:3). Jonas evidentemente era muito patriota e não perdeu as esperanças em seu país, mesmo nos dias mais sombrios. Portanto, essa missão a Nínive não era do seu agrado, visto que não sentia o desejo de ver essa grande cidade gentia arrependida, de joelhos. E ainda iria passar-se um século antes que Isaías e Miqueias proclamassem que o mundo gentio se voltaria para Deus (Mq. 4:1-2; Is. 2:2).
Em vez de desincumbir-se dessa missão de misericórdia, Jonas correu para o porto em direção a Társis, numa tentativa de esquivar-se ao seu dever. Como pode um homem imaginar poder escapulir dos planos do Senhor que tudo vê (Hb. 4:13)? O pecado é sempre uma descida; sempre temos de pagar pesadas taxas e passagens quando seguimos nosso próprio caminho em lugar do de Deus, e jamais devemos supor que a possibilidade de fazer algo significa permissão.
c) As consequências da desobediência (1:4-17). Cansado pelo nervosismo e pela viagem, o profeta nem se percebeu da partida do navio. As adversidades que bloqueiam o caminho da desobediência são mais duras do que as dificuldades para atender a ordem de Deus.
O pecado produz sempre algo negativo para aquele que o pratica, quer este seja ou não servo do Senhor. A confiança em si próprio é já, em si mesma, pecado, e conduz à desobediência. A desobediência, por seu lado, é a expressão da vontade humana.
Obviamente a atitude de Jonas não ficaria sem retribuição. Como um exemplo da soberania de Deus no livro de Jonas vemos como Deus empregou a sua criação para cumprir o seu plano divino. Observemos a operação divina: “Veio a palavra do Senhor… o Senhor lançou um forte vento e fez-se no mar uma grande tempestade, e o navio estava a ponto de se despedaçar (v. 4). Preparou o Senhor um grande peixe (v. 17). Vemos então como Deus controlou os elementos do tempo para trazer o seu propósito desejado, para chamar a atenção de Jonas. Aqueles marinheiros gentios, a quem Jonas causou pavor e desespero (1:4-11), provocou uma situação suicida (1:12-16), possuíam belos traços que deveriam ter deixado o profeta envergonhado. As orações deles aos seus ídolos e o seu esforço para salvar esse estrangeiro hebreu são admiráveis além de ser uma lição para nós.
No meio da tempestade, em que o mar ficava cada vez mais tempestuoso (vs. 11, 13), depois da desobediência, Jonas reconheceu que pelo facto de ser profeta do Senhor, não significava que pudesse ter qualquer atitude impunemente e, portanto, reconheceu que a tempestade tinha origem divina, e que a finalidade era impedir a sua fuga. Ele sabia discernir quando era o Senhor a agir. Por isso, Jonas desistiu da sua fuga e ofereceu a sua vida para que a vida dos marinheiros fosse salva. É surpreendente esta mudança! Depois de ver que não podia escapar ao poder de Deus, resolve entregar-lhe a vida (Jn. 1:12). Enquanto Nínive era uma cidade distante, os marinheiros eram pessoas que conheceu face a face. Jonas sentiu o seu medo e aflição. Talvez por isso Jonas tenha conseguido identificar-se com aqueles homens pagãos e decidir trazer sobre eles a bênção da vida.
Muitas vezes os cristãos não agem assim, mas ignoram os que os rodeiam. Isto porque para muitos de nós, diferentemente de Jonas, a tragédia do mundo parece nada ter a ver connosco. Todavia tem tudo a ver. A razão é simples: aqueles que são designados a ser bênção para o mundo tornam-se maldição para a sociedade, quando não assumem seu papel de bênção na vida.
Os cristãos muitas vezes têm a sua salvação por garantida e colocam em segundo plano a obediência ao Senhor. A Bíblia diz que a eleição divina não depende de obras: “... (pois não tendo os gémeos ainda nascido, nem tendo praticado bem ou mal, para que o propósito de Deus segundo a eleição permanecesse firme, não por causa das obras, mas por aquele que chama)...” (Rm. 9:11). No entanto, ainda que a eleição não dependa de obras, após a eleição devem existir obras (Tg. 2:14).
Quando a vontade humana se submete à vontade divina e a carne se submete ao Espírito, dá-se um fenómeno geralmente denominado de conversão. A conversão do homem é sujeição da vontade ao Senhor. Isto implica a renúncia do “eu” humano em função do “Eu” divino. Por isso Paulo diz de si mesmo: “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé no filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim” (Gl 2:20).
Jonas, devido à sua desobediência ia perdendo a vida na tempestade (Jn. 1:4, 15, 17). Assim, também, Cristo, ao tomar sobre si a nossa desobediência foi castigado em nosso lugar pagando com a morte. O pecado é sempre uma desobediência e a sua consequência é sempre morte, seja ela na vida espiritual, na vida material ou na vida física, como está escrito: “Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus nosso Senhor” (Rm. 6:23).
d) O clamor durante a calamidade – Uma Oração nas Profundezas (2:1-9). O vento e as ondas obedeceram a Deus, mas Jonas não obedeceu. Ao exercer o seu livre arbítrio, primeiro ele se recusou a ir a Nínive como Deus havia mandado. Como resultado desta desobediência, Deus deu uma oportunidade para Jonas se arrepender. Depois de ser lançado ao mar pelos colegas do navio, ele foi engolido por uma criatura do mar. O versículo 17 do capítulo 1 diz que a criatura que o engoliu foi preparada por Deus. Tem-se preocupado muito no decorrer dos anos em relação à identidade desta criatura.
O grande peixe era, provavelmente, um tubarão. O mesmo que enviou a tempestade preparou o peixe. A vida é cheia de expedientes por parte do grande Amigo dos homens. Seja qual for a nossa opção o amor paterno do Senhor está connosco para nos ajudar, sem desistir de nós, a encontrar o caminho certo. Na desobediência humana, a presença do Senhor mantém-se e pode contemplar-se, como em nenhuma outra ocasião, a incompreensível misericórdia divina. Mergulhar nas ondas é cair nos braços dele. Várias vezes já foram encontrados corpos humanos no ventre de tubarões no Mediterrâneo.
Jonas, quase a afogar-se na tempestade, foi salvo pelo peixe que o engoliu. O Senhor não deixou, simplesmente, que o profeta morresse, mas voltou a dar-lhe mais uma oportunidade. O Senhor deseja dar-nos sempre uma nova oportunidade! Ao “castigo” sobre Cristo seguiu-se também uma nova oportunidade para a humanidade.
A eficácia da oração tem sido comprovada nas mais diversas situações e Deus tem respondido a homens e mulheres que têm clamado dos mais variados lugares na face da terra, mesmo dentro do “ventre de um peixe” (2:1). Deus miraculosamente manteve Jonas vivo por três dias no estômago do peixe. Por ser um facto verídico Jesus, usou o incidente do peixe que engoliu Jonas para ilustrar sua própria morte, sepultamento e ressurreição (Mt. 12:39-41).
O Salmo que se segue é de grande inspiração para os que caíram nas profundezas por causa de seus erros. Deus os ouvirá, mesmo que gritem do “ventre do abismo”. Se alguém pensa que foi lançado fora das vistas de Deus para sempre, olhe para o “seu santo templo”, e verificará que o amor divino está gradualmente retirando-o do abismo. Confiar em nossos próprios esforços e expedientes é entregar-nos à idolatria vã e abandonar aquele que nos é misericordioso. “Ao Senhor pertence a salvação”. A natureza inteira aguarda a palavra de Deus. Tanto os enormes tubarões como os menores peixinhos estão sob o comando de Deus para auxiliar o homem. Apenas “lembrem-nos” de Deus, e, depois quando formos libertos, não deixemos de pagar os nossos votos!
Foi sempre o amor que provocou a acção do Senhor para com Jonas: o amor por Ninive, o amor pelos marinheiros, o amor por Jonas... É por amor que Deus intervém na viagem do barco onde viajava o profeta, como comenta Caio Fábio: “De repente os até então bem-sucedidos planos de Jonas são confrontados pelo pior de todos os oponentes: o amor apaixonado de Deus. Isso porque nenhuma fuga de Deus dura para sempre, quando aquele que foge é alguém que o conhece.”
e) O arrependimento de Jonas (2:10). O arrependimento e a mudança de carácter estão sempre nos objectivos de Deus ao lidar com o ser humano. O Senhor corrige aqueles a que ama como diz a seguinte passagem: “Ainda não resististes até o sangue, combatendo contra o pecado; e já vos esquecestes da exortação que vos admoesta como a filhos: Filho meu, não desprezes a correcção do Senhor, nem te desanimes quando por ele és repreendido; pois o Senhor corrige ao que ama, e açoita a todo o que recebe por filho. É para disciplina que sofreis; Deus vos trata como a filhos; pois qual é o filho a quem o pai não corrija? Mas, se estais sem disciplina, da qual todos se têm tornado participantes, sois então bastardos, e não filhos. Além disto, tivemos nossos pais segundo a carne, para nos corrigirem, e os olhávamos com respeito; não nos sujeitaremos muito mais ao Pai dos espíritos, e viveremos? Pois aqueles por pouco tempo nos corrigiam como bem lhes parecia, mas este, para nosso proveito, para sermos participantes da sua santidade. Na verdade, nenhuma correcção parece no momento ser motivo de gozo, porém de tristeza; mas depois produz um fruto pacífico de justiça nos que por ele têm sido exercitados” (Hb. 12:4-11).
A experiência de Jonas dentro do peixe foi para ele o mais valioso dos “retiros espirituais”. Jonas viu que estava fazendo tudo errado (v. 9). Ali, percebendo que agia como um idólatra (ou ateu), encontrou o arrependimento e a consciência da grandeza e do poder de Deus, e retomou o caminho da obediência (1 Sm. 15:23).
Existem semelhanças entre a experiência de Jonas e a experiência de Cristo. Jonas sente-se como estando no “Sheol”, termo hebraico para “lugar dos mortos” ou “inferno”. A oração de Jonas poderia ser a oração do Senhor quando se encontrava nas “profundezas da terra”, durante o tempo em que esteve morto. Ela reflete a angústia e o isolamento como consequência directa do pecado (Jn. 2).
O arrependimento cancela toda a maldição ou consequência espiritual de pecados passados (Jn. 3:10). Não há outro caminho possível, apenas o arrependimento ou a morte, seja ela espiritual ou física. Jonas só quando se encontrou próximo da morte é que encontrou o arrependimento (Jn. 2:7). Ao seu arrependimento seguiu-se a vida na presença do Senhor, como está escrito: “Arrependei-vos, pois, e convertei-vos, para que sejam apagados os vossos pecados, de sorte que venham os tempos de refrigério, da presença do Senhor” (At. 3:19).
II - UM MUNDO CLAMANDO POR MISSÕES
Nossa teologia determina a nossa visão de mundo. Precisamos de viver como cidadãos de dois reinos. Nossa missiologia precisa de ser teologicamente fundamentada, e nossa teologia missiológica focada.
Deus havia chamado o profeta eHe gives him a message to proclaim. lhe havia dado uma mensagem a proclamar. E o resultado da pregação é declarado e conhecido de antemão. Em outras palavras, o propósito divino é feito conhecido e realizado por um Deus que está disposto e capaz de fazer tudo o que Ele deseja. Deste modo, a segunda parte do livro mostra um novo Jonas, arrependido e disposto a cumprir o mandado missionário.
a) O novo chamado (3:1-2). A vida está cheia de distrações e interrupções. Uma coisa que a fé em Deus faz é nos trazer de volta ao centro. Nos traz de volta ao lugar onde devemos estar. É desta posição que podemos discernir o nosso verdadeiro lugar neste mundo e o nosso relacionamento com Deus. Ele é uma força inevitável. Ele está no controle. Ele rege. Quanto mais cedo aprendermos esta lição, mais cedo descobriremos o seu verdadeiro sentido e sua direção nas nossas vidas.
Por mais que tentasse, Jonas não podia escapar de Deus. Quanto mais ele tentou cumprir a sua própria vontade, mais forte Deus o puxou de volta. A chamada de Deus é sonora e clara. O alcance de Deus é longo e largo. A vontade de Deus não pode ser evitada ou negada sem consequências. Jonas pôde correr mas não pôde se esconder, e nem nós podemos.
Javé deu uma nova oportunidade a Jonas, voltando a convocá-lo para ir a Nínive, dizendo: “levanta-te”. Dessa vez, Jonas que estava na praia, por certo ainda meio confuso com tudo o que ocorrera, mas percebendo que não adianta fugir da obrigação de entregar mensagens duras, foi. As únicas palavras registadas de sua mensagem profética são: “Ainda quarenta dias, e Nínive será subvertida” (3:4). Surpreendentemente “os ninivitas creram em Deus” (v. 5). O povo e o rei de Nínive (v. 6) vestiram-se de panos de saco, e dedicaram-se ao jejum, à oração e ao arrependimento para evitar a destruição. Javé perdoou devidamente.
Os pregadores do Evangelho são semelhantemente convocados a proclamarem todo o conselho de Deus (At. 20:27; 2 Tm. 4:2). Devem pregar tanto a misericórdia quanto a ira de Deus; ou seja, o perdão e a condenação. Devem pregar de tal forma que as pessoas que ouvem se voltem de seus pecados.
Agradeçamos a Deus pelas segundas chances que ele nos dá. Dessa vez o profeta não hesitou. Levantou-se e foi. A história de sua libertação parece ter chegado a Nínive e ter preparado o povo da cidade para receber a palavra dele (Lc. 11:30). Só devemos pregar e entregar as mensagens de Deus do modo como ele ordena. Ele nos dirá o que devemos dizer.
b) O missionário obediente (3:3-4). Apenas ao compreendermos a soberania de Deus que é Absoluto, Senhor, Supremo, Soberano, e se O reconhecemos como tal, podemos compreender a importância de inteiramente obedecer a Deus e não aos homens (At. 5:29). Apenas então podemos apreciar o aviso, “Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo” (Mt. 10:28).
Toda a obediência deve, acima de tudo, ter como raiz o amor. Sem amor nenhum acto tem valor para o Senhor, como está escrito: “E ainda que distribuísse todos os meus bens para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria” (I Co. 13:3).
Nínive era importante por abrigar mais de 120 mil almas; essa era a preocupação e o seu valor para Deus (4:11). A submissão de Jonas pode ser vista por expressões significativas, tais como: “Levantou-se... e foi” (3:3); “começou Jonas a percorrer a cidade... e pregava” (3:4).
A obediência tem grande importância para o Senhor. Foi com uma desobediência que entrou o pecado no mundo, mas foi com uma obediência que esse pecado foi vencido (I Co. 15:21-48). “Tomar a cruz” é obedecer e todos somos exortados a tomar a nossa cruz e a seguir o Senhor, como está escrito: “E chamando a si a multidão com os discípulos, disse-lhes: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz, e siga-me” (Mc. 8:34). A importância da obediência é tal que no livro de Actos o Espírito Santo é referido da seguinte forma: “... o Espírito Santo, que Deus deu àqueles que lhe obedecem“ (At. 5:32).
Ser servo do Senhor é opor-se ao individualismo, que é uma doutrina moral, econômica ou política que valoriza a autonomia individual, em detrimento da hegemonia da coletividade despersonalizada, na busca da liberdade e satisfação das inclinações naturais, e ao culto do eu, que diz respeito ao conjunto de atitudes ou comportamentos de um indivíduo que se refere essencialmente a si mesmo. Em Isaías 53, fala do Servo que se oferece a sim mesmo para obedecer. Jonas obedeceu a segunda vez, dizendo: “o que votei pagarei...” (Jn. 2:9). Provavelmente havia prometido, como profeta que era, ir onde o Senhor o enviasse. Na sua segunda oportunidades decide pagar os seus votos.
Cristo, com alegria, obedeceu sempre à vontade do Pai, dizendo: “...A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e completar a sua obra“ (Jo. 4:34). Ele obedeceu até à morte: “...e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz” (Fp. 2:8). Filipenses 2 contrasta com a atitude de Jonas. Este obedeceu, mas não de coração, pois foi necessário chegar perto da morte.
c) Consequências da obediência (3:5-10). - A pregação de Jonas produziu resultados e os moradores de Nínive arrependeram-se de seus pecados. Houve, por um certo período, um retorno ao monoteísmo.
O arrependimento foi geral (v.5); foi prático (v. 8); e voltado para Deus (v. 9). Que contraste com Israel! Ali, vários e vários profetas foram repelidos e mesmo mal tratados. Seja qual for o tipo de temor que a mensagem despertou nos homens, o facto é que da parte de Deus não houve hesitação. Ele perdoou plenamente! (Ver Is. 55:7).
Nessa fase aconteceram duas grandes pragas, nos anos 765 e 759 a.C., e um eclipse solar, em 763 a.C. Esses acontecimentos podem ter sido interpretados como sinais de julgamento divino e, portanto, preparado a cidade para receber a mensagem profética de Jonas. Como expressão visível de seu verdadeiro arrependimento, “eles jejuaram, vestiram-se de pano de saco” (3: 5).
d) Lição e censura a Jonas – Deus Censura a Visão Limitada do Profeta (4:4-11).
Quando Deus agiu, salvando os ninivitas, Jonas ficou contrariado (v. 8), e toma a iniciativa de fugir para Társis, porque está apenas a pensar em si mesmo e na segurança política de Israel. Jonas se esqueceu de todos os votos que muito provavelmente fizera como profeta (Jn 2:9) e decide “fugir” da presença do Senhor, como se isso fosse possível. Para Israel, a presença do Senhor estava em Jerusalém, mais especificamente no templo, logo Jonas pensou que se afastasse o mais possível de Jerusalém conseguiria fugir do Senhor (I Rs. 9:7 II Rs. 17:20, 23; 24:20; Jr. 52:3). O profeta em primeiro lugar procura isolar-se, mas não é o lugar físico onde se encontre que o afasta de Deus e sim o seu pecado de desobediência. Assim como a sua separação do Senhor não é da “sua presença”, mas da “sua comunhão”.
Jonas tinha a escolha de ir a Nínive ou de fugir. No primeiro capítulo, o vemos fugindo de Deus mas depois, no terceiro capítulo, quando Deus o manda para Nínive, ele decide ir. O povo de Nínive encarou a certeza de destruição iminente por causa dos seus pecados passados e persistentes. Mesmo assim, sem Jonas oferecer uma alternativa para eles, escolheram se arrepender dos seus pecados. Eles assim fizeram na esperança de transformar a ira de Deus em bênçãos. Deus não sente prazer em destruir as pessoas. “Porque não tenho prazer na morte de ninguém, diz o Senhor Deus. Portanto, convertei-vos e vivei” (Ez. 18:32). No Novo Testamento aprendemos que “Ele é longânimo para convosco, não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento” (2 Pe. 3:9). Por causa do arrependimento de Nínive, Deus com o seu poder soberano reverteu a sua decisão de destrui-los.
Ninive era um inimigo político de Israel. Mas Deus olha para todos os homens com o mesmo interesse. O profeta, porém, não considerou de importante pregar o arrependimento a uma nação pagã, tão desagradável aos israelitas. Jonas apenas estava pensando só em si, no seu bem-estar, naquilo que lhe agradava, no seu prazer, no seu conforto. Esse é um paradoxo que se vivência quando se está encharcado de perspectivas ideológicas do tipo colectivista. Neste caso o colectivismo pode gerar um tremendo egoísmo em relação a um único ser que a pessoa não deixa de levar em consideração, que é ele próprio.
Ele colocou os seus interesses pessoais à frente dos interesses do reino de Deus. Foi preciso que Deus o levasse a sentir o valor de uma alma. Se Jonas creu ser razoável irar-se por uma planta com a qual não contribuiu em nada para a sua existência, como não dar a face para compreender o tão grande e poderoso amor de um Deus-Criador, que fizera com carinho e doçura cada criatura que estava naquela metrópole?
A visão de Jonas quanto à sua missão se reduziu em função da sua cartilha ideológica. Sua atitude obstinada contra Ninive não é propriamente o resultado do seu senso de justiça, mas do seu condicionamento ideológico. Prova disso é o facto de que encontramos nele duas categorias de justiça. A primeira é aquela justiça que ele aplicava aos que estavam do lado de fora de Israel, vistos por ele como inimigos dos seus sonhos políticos e nacionalistas.
Esse capítulo assinala uma era no desenvolvimento da visão espiritual do povo hebreu. Aqui uma cidade gentia que se arrependeu foi perdoada. Ficou claro que Javé era Deus não apenas dos hebreus, mas também dos gentios. Contudo, Jonas não sentiu prazer nessa revelação. Apegou-se à amarga estreiteza do preconceito nacional, temendo que, quando o seu povo recebesse a notícia do arrependimento e livramento de Nínive, se sentisse fortalecido em sua obstinada rejeição da lei de Deus.
Jonas toma uma posição carnal ao colocar o seu comodismo pessoal acima de valores eternos. Enquanto a cidade de Ninive perecia, o profeta pensava apenas no seu bem-estar pessoal. Tal como Jonas, muitas vezes os cristãos fogem à responsabilidade da pregação aos ímpios (Jn. 1:3).
e) Deus expressa o seu amor por Nínive: Todo o capítulo 4 do livro de Jonas é uma lição acerca do amor e misericórdia de Deus. O amor do Senhor estende-se a todos os homens e não apenas aos seus profetas ou servos. Até os animais são alvo da misericórdia divina. Sabiamente, usando uma aboboreira, Deus ensinou acerca da compaixão.
Isto porque Jonas traz a Deus as suas queixas, suas razões, seus complexos, sua amargura, seus direitos, suas reivindicações, e no fim ouve Deus dizer: “Alto lá! Tu te preocupas com a sombra para a tua cabeça enquanto queres que o meu fogo caia na cabeça de uma cidade? Tu te preocupas com a vida de uma planta, e não dás a mínima para a existência de toda uma civilização? Tu sofres a perda do que não te custou nada e queres que eu despreze o que criei? Então Deus diz: “Alto lá, Jonas, eu tenho mais o que fazer”! Sou Eu quem está no controle do destino das nações. A cidade de Nínive e o seu futuro está sob o meu controle. Se é desejo meu destrui-la, será destruída. Se meu desejo é salvá-la, será salva.
Jonas não tinha nenhuma soberania no assunto. Não seria feito de acordo com a sua vontade, mas de acordo com a vontade de Deus. Paulo, ao falar com os atenienses, disse: “de um só fez toda a raça humana para habitar sobre toda a face da terra, havendo fixado os tempos previamente estabelecidos e os limites da sua habitação” (At. 17:26).
O destino dos homens e das nações está na mão soberana de Deus. Foi pela soberania de Deus que a mensagem chegou a Nínive. Se Jonas tivesse insistido na sua recusa de ir a Nínive, teria impedido Deus de enviar outro? Certamente não! Deus poderia ter enviado um outro profeta. Aqueles que pensam que as nações se levantam e caem por causa de uma defesa nacional forte, prosperidade económica, alianças com outras nações, ou pela vontade dos homens, são ignorantes da soberania de Deus.
1) O amor do Criador por seus filhos, embora tenham eles vivido em pecado e rebelião contra suas Leis, vai além de qualquer amor ou sentimento humano (Rm. 5:8).
Jonas foi enviado a pregar a salvação para o maior inimigo de Israel: a Assíria. Esta é a nova lei de Cristo, amar o mundo, amar o inimigo... Cristo soube perdoar aqueles que executavam a sua própria morte.
Esta é a sua vontade: o amor a Ele mesmo e o amor aos homens. Tudo o que Ele nos ordena caminha para este alvo. Este é o “caminho excelente” que Paulo descreve em I Coríntios 13.
2) O amor de Deus pela humanidade estende-se para além de qualquer fronteira, até às pessoas perdidas em qualquer lugar. Esta verdade foi plenamente vista:
a) quando Deus enviou seu Filho Jesus para morrer por todas as pessoas (Jo 3:16); e
b) quando Jesus enviou os discípulos a todo o mundo para pregar o Evangelho e fazer discípulos de todas as nações (Mt. 28:18-20).
Deus é universal e ama todo o mundo (Jo. 3:16): ele ama tanto o judeu como o gentio e deseja o arrependimento de todas as nações. O livro de Miqueias refere esta ideia: “Quem é Deus semelhante a ti, que perdoas a iniquidade, e que te esqueces da transgressão do resto da tua herança? O Senhor não retém a sua ira para sempre, porque ele se deleita na benignidade” (Mq. 7:18). A misericórdia divina é sem limites e foge à nossa compreensão. Em Jonas 4:11, diz ter compaixão dos homens e até mesmo dos animais, por isso derramou sobre Nínive o seu perdão. No final todos aprenderam acerca do amor do Pai. Caio Fábio comenta esta lição da seguinte forma: “Jonas diz: “Eu sabia”, mas na realidade não sabia nada sobre o amor de Deus (4:2). Já os ninivitas dizem: “Quem sabe?” (3:9) afirmando suspeita cheia de convicção. E recebem a graça que suspeitam existir no coração de Deus”.
Conclusão
Jonas é o mais humano de todos os profetas. Talvez por isso tenha sido escolhido para simbolizar Cristo no seu sacrifício pela humanidade. A história de Jonas pode descrever de forma simples a tentativa divina de conduzir o homem à obediência incondicional, ao amor ao inimigo e ao entendimento acerca da pessoa de Deus.
Cristo, agindo em substituição do homem pecador, foi castigado em seu lugar descendo ao Sheol. Após esta experiência seguiu-se a salvação para o mundo. Assim também Jonas pagou pela sua desobediência e seguidamente proclamou salvação que resultou no perdão da cidade de Nínive.
Nínive representa a vontade do Senhor, que está sempre ligada à Palavra de Deus. Certamente na nossa vida têm surgido Nínives! Sabemos qual é a vontade do Senhor, mas teimosamente resistimos, porque não aceitamos ou não compreendemos qual o propósito divino. Obediência é estar disposto a cumprir uma ordem mesmo que não seja compreendida.
Társis representa a nossa vontade. É o “lugar” para onde queremos fugir. Desobediência é seguir o nosso próprio desejo numa atitude egocêntrica e individualista. Optar pelo nosso querer coloca-nos numa posição de distância para com o Senhor, no que diz respeito à comunhão com ele e não a uma distância física. Ele continua presente convencendo-nos do pecado (Jo. 16:8) e corrigindo-nos sem nunca desistir.
Jonas escolheu o caminho mais difícil. Foi necessário, quase perder a vida, para compreender a obediência. Talvez nem tenha chegado a compreendê-la: aquela obediência que age apenas por amor.
O ponto que precisamos de compreender é que tudo obedeceu a Deus. O vento obedeceu, a criatura do mar obedeceu, a planta obedeceu e o verme obedeceu. Tudo obedeceu a Deus perfeitamente, menos Jonas. Toda a criação de Deus o obedece perfeitamente, exceto o homem. Deus deu a Jonas uma escolha e Deus nos dá uma escolha. Escolhemos fazer a vontade de Deus ou resistir e fugir dele. Deus não abandona a sua soberania neste assunto. Foi da sua vontade soberana que o homem exercesse o livre arbítrio.