Introdução
O livro de Salmos se inicia com esta joia preciosa. Este
salmo é um dos mais bem conhecidos e favorecidos no Saltério. Ele resume os
dois caminhos da vida disponíveis para as pessoas, o caminho para a bênção do
justo e o caminho do julgamento para o ímpio (cf. Dt. 30:11-20; Jr. 17:5-8). Qualquer
pessoa deverá escolher entre um deles. Ele lida também com Deus, com o viver
piedoso e a esperança do justo em vista das promessas do pacto mosaico.
Portanto, ele é apropriado para abrir a coleção de 150 salmos. Em vista do seu
conteúdo, é um salmo de sabedoria e didático, designado para dar entendimento
ao leitor (cf. Pv. 2:12-22).
É desejo do
salmista ensinar-nos o caminho para a bem-aventurança e avisar-nos sobre a
destruição certa dos pecadores. Este Salmo serve como
estímulo para que busquemos o caminho da verdadeira felicidade.
Davi é o autor da maioria dos Salmos;
porém, é evidente que alguns foram compostos por outros escritores e ainda
existem dúvidas sobre quem foram os autores de alguns deles. Não obstante,
todos eles foram escritos por inspiração do Espírito Santo. Entre todos os
livros do Antigo Testamento, nenhum tem agradado tanto ao coração humano
como os Salmos. Nenhuma outra
parte é mais frequentemente citada ou referida no Novo Testamento do que o
livro dos Salmos.
Em nenhum outro livro da Bíblia podemos encontrar tal variedade de experiências
religiosas. Cada Salmo dirige-se diretamente a Cristo, seja à sua pessoa,
seja ao seu caráter ou ofícios, ou pode conduzir a Ele os pensamentos dos
crentes.
No Livro dos Salmos existe uma qualidade universal
que só pode advir da expressão combinada das experiências espirituais dos
homens nos muitos períodos da história e numa variedade de circunstâncias da
vida. Cada homem foi motivado pelo seu desejo de reação para com o Deus vivo.
Todos foram unidos pelo seu desejo inerente de reagir através de suas mais
profundas emoções. Cada tipo de experiência religiosa reflete-se no cadinho da
vida dada e projeta-se sobre a vida do crente de hoje. Assim, encontramos
nos Salmos uma
ausência da limitação do tempo que torna este livro igualmente aplicável a cada
período da história.
Os Salmos são a linguagem do coração do
crente, seja para lamentar-se pelo pecado, seja para expressar a sede que sente
pela presença de Deus ou regozijar-se nEle. Nas ocasiões em que estivermos
carregados de aflições, quando lutamos contra as tentações ou triunfamos na
esperança ou no gozo da libertação; seja quando admiramos a perfeição divina ou
estejamos agradecidos ao Senhor por suas misericórdias; seja quando meditamos
em suas verdades ou nos deleitamos em seu serviço.
Os salmos formam uma norma de vida divinamente
estabelecida, pela qual podemos julgar a nós mesmos. O valor destes é muito
grande a partir deste ponto de vista e a sua utilização aumentará com o
crescimento da verdadeira fé no coração. O Espírito Santo nos ajuda a orar
quando utilizamos as expressões do salmista. Se nos familiarizarmos com
os Salmos em
todas as nossas petições perante o trono da graça ou em nossas confissões ou
ações de graça, poderemos ser assistidos por eles. Qualquer que seja a devota
emoção que nos embargue, um desejo piedoso ou uma santa esperança, tristeza ou
gozo, nos salmos podemos encontrar as palavras de consolo, um falar que não pode
ser condenado. Na linguagem deste livro divino, têm sido elevadas ao trono da
graça as orações e os louvores da Igreja, século após século.
Escrito sob a influência do Espírito de inspiração,
o seu objecto é digno de sua origem celestial. Em geral, ele contém detalhes da
história nacional do povo judeu, os registos de partes específicas da vida e da
experiência dos indivíduos e as previsões de eventos futuros. Este salmo
continua a mostrar a escolha sóbria que é base disto.
Nós nos encontramos com muitas revelações da
grandeza, majestade e perfeições do único Deus verdadeiro, do seu governo do
mundo e seus cuidados especiais sobre o seu povo escolhido. Têm-nos apresentado
muitas predições maravilhosas a respeito do Messias, sua humilhação,
sofrimento, morte, ressurreição, ascensão e de sua posição à direita de Deus
Pai; sua obra no céu como intercessor de seu povo e sua autoridade como Rei
universal, a efusão das influências do Espírito Santo e a conversão de todas as
nações para a fé do Evangelho. Em suma, se desdobraram em nosso entender, o
acórdão final, o recolhimento de todos os justos a Deus e à exclusão eterna dos
ímpios de felicidade e de esperança.
Estes e outros temas que constam das mais nobres
linhagens da poesia, e em cuja dicção, magnificência e sublimidade correspondem
à importância e grandeza dos sentimentos, constituem o material deste livro, e
enquanto eles oferecem uma prova incontestável de que é inspirado, que não
consta das criações do génio humano simples, mas é uma emanação do céu, eles
mostram que o seu carácter e tendência é completamente diferente da personagem
e da tendência dos mais admirados da poesia, que o génio das nações pagãs tem
já produzido. Ela ensina a piedade mais exaltada, e da mais pura moralidade.
Tende apenas para refinar e exaltar a natureza do homem, para elevar a alma a
Deus e inspirá-la com a admiração e o amor de seu personagem, para refrear as
paixões, purificar os afectos e estimular o cultivo de tudo o que é verdadeiro,
honesto, justo, puro, amável e de boa fama.
Este livro tem sido muito apreciado em conformidade
com o melhor dos homens em todos os tempos e eles têm trabalhado para descobrir
as expressões em que expõem a sua excelência. Muitos dos Salmos, para além do
significado literal, têm um sentido profético, evangélico e um sentido
espiritual. Embora referindo-se principalmente a David e à nação de Israel,
eles têm, ao mesmo tempo, uma referência a Cristo e à Igreja do Novo
Testamento, fundada no facto de que as primeiras eram típicas deste último.
Este salmo
consiste de duas partes: na primeira (do versículo 1 ao versículo 3), Davi
expõe em que consiste a felicidade e a bem-aventurança de um homem piedoso,
quais são os seus procedimentos e quais as bênçãos que receberá do Senhor. Na
segunda parte (do versículo 4 ao final), ele contrasta o estado e o caráter
daqueles que não têm Deus, revela o futuro, e descreve, em linguagem
impressionante, seu destino final.
Salmo
Um
Estudando este capítulo
de Salmos, que foi chamado o salmo do limiar, estamos em frente de um lindíssimo
poema que pode perfeitamente ser a introdução de todo o saltério. Ele nos põe
face a face com o desafio lançado pelo Antigo Testamento a todos os homens e
que trata da felicidade duma vida inteiramente entregue a Deus e da completa
destruição que aguarda aqueles que voltam suas costas para o Eterno. O salmista
crê que a comunhão ou amizade com Deus, só se obtém quando se faz um curso
especial, para se aprender a Palavra de Deus e a comunhão com ele; quando se expulsa
do pensamento e da conduta aquelas coisas que desagradam a Deus.
Este poema descreve o homem ideal e nos revela algo
do seu carácter, da sua influência, da sua conduta e do seu destino. É muito
interessante notar que esses quatro pontos são a espinha dorsal do Sermão do
Monte (Mt. 5). São como uma placa de sinalização, indicando
ao homem a estrada da bem-aventurança. Jesus conseguiu achar o germe de
todos os ricos requisitos de bem viver, no simples esboço que Davi nos dá aqui.
Neste capítulo, o salmista nos dá o retrato de dois
homens. Um deles sabe se conservar numa direção certa; sabe usar bem suas horas
vagas; sabe buscar boas companhias; gosta de meditar na Palavra de Deus e se
delicia em agradar a Deus com suas palavras, pensamentos e ações. Já o outro é
bem diferente, exatamente o oposto. É, assim, em vez de ser uma pessoa firme,
frutífera e feliz, vê-se completamente desarvorado, perdido, esfalfado e batido
pelas tempestades da vida, e finalmente destruído por não ter comunhão com
Deus. Dificilmente encontraremos tratamento melhor deste assunto, pois ele está
em perfeita consonância com o cerne do divino padrão.
Quem quer que tenha feito a coletânea dos Salmos em
um só volume, seja Esdras ou alguma outra pessoa, parece ter colocado este
Salmo no início, a título de prefácio, no qual o autor inculca a todos os
piedosos o dever de meditar sobre a lei de Deus. A soma e substância de todo o Salmo
consistem em que são bem-aventurados os que aplicam seus corações na busca da sabedoria
celestial; ao passo que, os profanos desprezadores de Deus, ainda que por algum
tempo se julguem felizes, por fim terão um final mais infeliz.
“Bem-aventurado o homem que não anda
segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se
assenta na roda do escarnecedor. Mas tem o seu prazer na lei do Senhor, e na
lei faz a sua meditação de dia e de noite” (Sl. 1:1-2).
A palavra inicial deste
salmo, “Bem-aventurado” trata-se de um termo que enfatiza a alegria. No Novo Testamento
Jesus usou esta expressão para se referir à verdadeira felicidade. A intenção
do salmista, segundo expressei acima, é que para uma vida bem-sucedida, tudo
deve estar sempre bem com os devotos servos de Deus, cuja incansável diligência
é entrarem na companhia dos profetas e
reis, dos salmistas e historiadores, e, principalmente, na do próprio Deus, os
quais nos falam através das Escrituras; é serem dirigidos pela Palavra e
fazerem progressos no estudo da mesma e não se limitarem apenas a ler a Bíblia, mas a meditarem nela, porque é
melhor um versículo bem mastigado, do que um capitulo inteiro engolido às
pressas. Ao invés de seguirem os conselhos errados, devem encontrar na
Palavra a fonte de conselhos sábios que os conduzirão à vida, já que o maior
contingente do género humano vive sempre acostumado a escarnecer da conduta dos
santos como sendo mera ingenuidade e considera o seu labor como sendo total desperdício.
São livres-pensadores cínicos, espíritos orgulhosos e autossuficientes. São de
pensamentos e linguagem desdenhosa no que concerne a Deus.
O salmista declara que o indivíduo que realmente
merece o nome de justo é aquele que terminantemente recusa andar ou viver na
atmosfera criada por tais homens maus. Não tem o menor desejo de se deter ou de
gastar tempo na companhia desses que tragicamente erram o alvo da vida. Foge de
assentar-se na roda desses escarnecedores, para não ser contado como um deles.
Deste modo, é de suma importância que o justo se deleite
no que Deus diz, ouvindo com atenção e seja confirmado no caminho da santidade,
pela consideração da miserável condição de todos os homens destituídos da
bênção de Deus e da convicção de que Deus a ninguém é favorável senão àqueles
que zelosamente se devotam ao estudo da verdade divina. Além do mais, como a
corrupção sempre prevaleceu no mundo, a uma extensão tal que o carácter geral
da vida humana, nada mais é do que um perene afastar-se da lei de Deus.
O salmista, antes de declarar a ditosa sorte dos
estudantes da lei divina, os admoesta a se precaverem para não se deixarem
levar pela impiedade da multidão que os cerca. Ele nos ensina como é impossível
para alguém aplicar sua mente à meditação da lei de Deus, se antes não recuar e
afastar-se da sociedade dos ímpios. Eis aqui sem dúvida uma admoestação em
extremo necessária; porquanto vemos quão irrefletidamente os homens se precipitam
nas armadilhas de Satanás; no mínimo, quão poucos, comparativamente, há que se
protegem contra as fascinações do pecado.
Para que vivamos plenamente conscientes de todos os
perigos que nos cercam, necessário se faz recordar que o mundo está saturado de
corrupção mortífera e que o primeiro passo a dar para viver bem consiste em
renunciar a companhia dos ímpios; consiste em ter consciência de que Deus nos conhece e nos ama (Ver Salmo 56:8), de
outra sorte, é inevitável que nos contaminemos com a sua própria poluição. O impio começa com a impiedade, depois passa
ao escarnecimento e termina como palha (Mt. 13:30).
Como o salmista, em primeiro lugar, prescreve
aos santos precaução contra as tentações para o mal, seguiremos a mesma ordem. Sua
afirmação de que é bem-aventurado, – plantado
junto aos rios, dando fruto e prosperando (Ver Génesis 39:34; 49:22) - quem
não têm nenhuma associação com os ímpios, é o que o comum sentimento e opinião do
género humano dificilmente admitirá; pois enquanto todos os homens naturalmente
desejam e correm após a felicidade, vemos com quanta determinação se entregam a
seus pecados; sim, todos aqueles que se afastam ao máximo da justiça, procurando
satisfazer suas imundas concupiscências, se julgam felizes em virtude de
alcançarem os desejos de seu coração.
O salmista, ao contrário, aqui nos ensina que ninguém
pode ser devidamente encorajado ao temor e serviço de Deus e bem assim ao
estudo de sua lei, sem que convictamente, se persuada de que todos os ímpios
são miseráveis e que os que não se afastam de sua companhia se envolverão na mesma
destruição a eles destinada. Como, porém, não é fácil de evitar os ímpios com
quem estamos misturados no mundo, sendo-nos impossível distanciar-nos totalmente
deles, o salmista, a fim de imprimir maior ênfase à sua exortação, emprega uma
multiplicidade de expressões.
Em primeiro lugar, ele nos proíbe de andarmos segundo a conselho
dos impios; em segundo lugar,
de nos
determos no caminho dos pecadores; e, finalmente, de nos assentarmos junto deles.
Notemos bem a forma como o primeiro versículo deste Salmo
demonstra uma progressão entre os verbos andar,
deter-se e assentar-se; e dos substantivos conselho, caminho e assento; e dos adjetivos impios, pecadores e escarnecedores. Podemos assim observar que passo
a passo o pecado é um ato contínuo, induzindo sempre o pecador para ir mais
além no seu erro. Começa por andar, depois por se deter e, por fim, por se
assentar a despojar-se.
Demonstra aquela pessoa que vai aos poucos atentando
e se acomodando aos conselhos daqueles que desprezam o Senhor. Os ímpios com
suas práticas e conquistas são efêmeros e passageiros, como “a palha que o
vento dispersa” (v. 4). Isto porque não serão poupados no juízo (v. 5),
permanecendo separados daqueles que andam segundo o conselho de Deus. Seu fim é
a destruição (v. 6).
A
suma de tudo é: os servos de Deus devem diligenciar-se ao máximo por cultivar
aversão pela vida ímpia. Essas etapas sucessivas na estrada do mal devem ser
religiosamente evitadas por esse homem que tem sabedoria suficiente, para ver
que a vida é muito curta para ser assim esbanjada com um comportamento iniquo.
Os servos de Deus devem andar sempre em direção
oposta ao “curso deste mundo”
(Ef. 2:2), não aceitando conselhos de pessoas que os induzirão a pecar contra o
Senhor (Is. 30:1; Pv. 12:5). O cristão que se preza, anda segundo o conselho de
Deus por meio do Espírito Santo (Sl. 33:11; Gl. 5:25).
O crente não pode se embaraçar com as coisas desta
vida (Hb 12.1). Quando ele começa a se envolver com as práticas comuns aos
ímpios, é porque se deteve naquilo que o levará consequentemente à morte
espiritual. Esse é um estágio mais adiantado que o anterior, no qual ele já
experimentou andar no pecado, se adaptou e se deteve.
As rodinhas onde se contam piadas “evangélicas”,
ou não, são a característica marcante de um ajuntamento onde a igreja, os
líderes e Deus são escarnecidos (Pv. 1:22).
Estejamos atentos, pois a habilidade de Satanás consiste
em insinuar seus embustes, de uma forma muito astuta. O salmista, a fim de que
ninguém se deixe insensivelmente enganar, mostra como paulatinamente os homens
são ordinariamente induzidos a se desviarem do reto caminho.
No primeiro passo, não se precipitam em franco
desprezo a Deus, mas, tendo uma vez começado a dar ouvidos ao mau conselho,
Satanás os conduz, passo a passo, para um desvio mais acentuado, até que se lançam
em transgressão aberta. O salmista, portanto, começa com um conselho, termo
este, a meu ver, significa a perversidade que ainda não se exteriorizou
abertamente.
A seguir o salmista fala da vereda, o que deve ser tomado
no sentido de habitual modo ou maneira de viver. E coloca no ápice da
ilustração o assento, uma expressão metafórica que designa a obstinação produzida
pelo hábito de uma vida pecaminosa. Da mesma forma, também, devem-se entender os três verbos,
a andar, deter e assentar.
Quando uma pessoa anda voluntariamente, em consonância
com a satisfação de suas corruptoras luxúrias, a prática do pecado o enfatua
tanto que, esquecido de si mesmo, se torna cada vez mais empedernida na
perversidade, o que o salmista denomina de deter-se no caminho dos pecadores. Então, por fim, segue-se uma desesperada
obstinação, a qual o salmista expressa usando a figura assentar-se.
Ora, se nos dias do salmista, necessário se fazia que
os devotos adoradores de Deus evitassem a companhia dos ímpios, a fim de manterem
a sua vida bem estruturada, quanto mais necessário é no tempo presente, quando
o mundo se transformou em algo muitíssimo mais corrupto. O nosso dever é evitar
criteriosamente todas as ameaças da sociedade, para que nos conservemos
incontaminados de todas as suas impurezas.
O salmista, contudo,
não só prescreve aos fiéis que se mantenham à distância dos ímpios, temendo ser
contaminados por eles, mas também que cada um seja prudente, a fim de que se
não corrompa e nem se entregue. Mesmo que uma pessoa
não tenha ainda contraído todo o aviltamento provindo dos maus exemplos, no
entanto é possível que se assemelhe aos perversos, ao imitar espontaneamente os
seus hábitos corruptos.
No
segundo versículo, o salmista não declara simplesmente ser bem-aventurado aquele
que teme a Deus, como faz em outros passos, senão que designa o estudo da
lei, como sendo a marca da piedade, nos ensinando que Deus só é
corretamente servido quando a sua lei for obedecida; quando se busca respostas
e se recorre à Palavra de Deus e não a conselhos de pessoas sem o temor de
Deus. Não se deixa a cada um a liberdade de codificar um sistema de religião ao
sabor de sua própria inclinação, senão que o padrão de piedade deve ser tomado
da Palavra de Deus.
Quando Davi aqui, fala da lei, não deve ser deduzido
como se as demais partes da Escritura fossem excluídas, mas, antes, visto que
toda a Escritura outra coisa não é senão a exposição da lei, ela é como a
cabeça sob a qual se compreende todo o corpo.
O salmista, pois, ao enaltecer a lei, inclui todo o
resto dos escritos inspirados. É mister, pois, que ele seja compreendido como a
exortar os fiéis a meditarem também nos Salmos. Ao caraterizar o santo se
deleitando na lei do Senhor, daí podemos aprender que obediência forçada ou
servil não é de forma alguma aceitável diante de Deus, e que só são dignos
estudantes da lei aqueles que se chegam a ela com uma mente disposta e que se
deleitam com as suas instruções, não considerando nada mais desejável e
delicioso do que extrair dela o genuíno progresso. Desse amor pela lei procede
a constante meditação nela, o que o salmista menciona na última cláusula do
versículo; pois todos os que são verdadeiramente impulsionados pelo amor à lei
devem sentir prazer no diligente estudo dela.
Somos comparados a ovelhas, animal ruminante que
passa a noite regurgitando e mastigando o alimento que engoliu durante o dia.
Desta forma, o cristão se alimenta da maravilhosa Palavra de Deus e “rumina de
dia e de noite”.
Ser cristão significa
ser uma nova criatura em Cristo Jesus (2 Co. 5:17) que corresponde ao “nascer de novo” em João 3:5. Esse
processo acarreta em mudanças radicais, que começam no espírito do homem. Logo,
os desejos do coração do servo de Deus têm novo alvo, e agora, ele se deleita
no Senhor e tem grande prazer em seus mandamentos e não no mundo (Sl. 37:4; 112:1).
“Ele
será como uma árvore plantada junto a ribeiros de águas, que produz o seu fruto
na estação própria, cujas folhas não murcharão e tudo quanto faz prosperará”
(Sl. 1:3).
Porque está plantado junto à fonte da fertilidade
espiritual, se torna qual árvore forte e vigorosa, formosa e garbosa, cujas raízes
são muito profundas no subsolo e alcançam lençóis de água, dos quais recebem
ocultamente o alimento que vai aparecer abertamente em frutos abundantes no seu
devido tempo e as suas folhas não murcham. Estando firmemente plantada, jamais
os ventos que varrem a planície conseguem derribá-la, porque a esperança e a fé
sustentam e fortificam essas pessoas, pois a sua confiança está em Deus
(Sl. 56:11).
Esta
afirmação revela a vitalidade do cristão. Uma vez seguidas as recomendações nos
vs. 1 e 2, ele pode esperar resultados esplêndidos em sua vida espiritual, pois
será idêntico a uma planta regada constantemente. É junto às margens de rios e
lagoas que se encontram as terras mais férteis e, da mesma forma, a vida cristã
vigorosa não permite distanciar-se da Palavra do Senhor.
O
salmista nos diz que uma vida que se alimenta da Palavra de Deus, que se alegra
em fazer a vontade de Deus, é sempre frutífera, produzindo boas obras. A
combinação do viver limpo com o comer a Palavra de Deus, e com o produzir
fruto, o conservará vigoroso no seu interior, como no seu exterior e produzirá
essa espécie de vida que positivamente influenciará para o bem, onde quer que
esteja.
Aqui
temos a produtividade do crente. É importante frisar que as árvores, exceto as
de enxerto, só produzem fruto na estação própria. Portanto, o cristão que tem
raízes firmes, profundas e que está bem fixo e otimamente sustentado, não deve
se preocupar em forçar a produção de frutos em sua vida, mas sim, em prover os
meios necessários para que, no devido tempo, eles apareçam (Jo. 15:1-8; 2 Pe. 1:5-8).
Trata-se
de uma promessa para o fiel. Encontra paralelo na profecia de Jeremias 17:5-10.
Lembre-se de que a árvore é um ser vivo em dinâmico ciclo de crescimento,
fotossíntese, alimentação, geração de frutos, mudança de folhagem etc. Assim é
o crente que está ligado à Palavra de Deus. Ele absorve seus ensinos vitais e o
Senhor transforma isso em crescimento e frutos. O justo não teme as estações,
pois as suas raízes estão solidas e totalmente seguras pela Rocha, que é
Jesus. “Mas eu confio em ti, ó Senhor; digo: Tu és o meu Deus. Todos os meus
dias estão nas tuas mãos...”
(Sl. 31:14, 15).
Aqui, o salmista ilustra, e, ao mesmo tempo confirma pelo uso de metáfora, a
afirmação feita no versículo anterior; pois ele mostra em que sentido os que
temem a Deus devem ser considerados bem-aventurados, ou seja, não porque desfrutem
de evanescente e infantil alegria, mas porque se encontram numa condição saudável.
Há nas palavras um contraste implícito entre o vigor de uma árvore plantada num
sítio bem regado e a aparência decaída de uma que, embora possa florescer
lindamente por algum tempo, no entanto logo murcha em decorrência da aridez do
solo em que se acha plantada.
Com respeito aos ímpios, como veremos
mais adiante (Salmo 37:35),
eles são às vezes como “os cedros no Libano”. Desfrutam de uma prosperidade tão
exuberante, tanto de riquezas quanto de honras, que nada parece faltar-lhes
para a sua presente felicidade. Não obstante, quanto mais alto se ergam e
quanto mais se expandem por todos os lados os seus galhos, uma vez não
possuindo raízes bem fincadas na terra, nem ainda suficiente humidade da qual venha
a derivar seus nutrientes, toda a sua beleza e grandeza desaparece.
Apenas
e tão-somente pela bênção divina é que alguém pode permanecer numa condição de
prosperidade. Os que explicam a figura dos fiéis produzindo o seu fruto na
estação própria, significando que sabiamente discernem quando uma coisa que
deve ser feita, até onde pode ser bem-feita, em minha opinião revela mais subtileza
do que bom senso, impondo às palavras um sentido que ele jamais pretendeu.
A
intenção do salmista é nada mais, nada menos de que os filhos de Deus floresçam
constantemente e sejam sempre regados com as secretas influências da graça
divina, de modo que tudo o que lhes possa suceder será proveitoso para a sua
salvação. Enquanto que, em contrapartida, os ímpios são arrebatados pelas repentinas
tempestades ou consumidos pelo escaldante calor. E
ao dizer: “produz seu fruto na estação própria”, ele expressa o pleno do fruto
produzido, ao passo que, embora os ímpios aparentem precoce fecundidade, contudo
nada produzem que conduza à perfeição.
Nesse
estágio, o cristão tem o retorno merecido pela sua fidelidade ao Senhor: a
prosperidade. Embora esteja implícita a ideia de riquezas materiais, o ensino
principal é que todos os planos e investimentos na vida espiritual terão êxito.
A relação é com a “árvore plantada junto a ribeiros de águas”, pois a sua
progressão está intimamente relacionada com o terreno e a água abundante. Portanto,
o cristão só prosperará se a sua vida estiver pautada na Palavra do Senhor e a
sua vida totalmente Nele, por Ele e para Ele. (Jo. 15:1-7; Ef. 1:3).
O
ímpio está em “lugares escorregadios”
(Sl. 73:18), mas o cristão é feliz por sua estabilidade. As árvores normalmente
perdem as suas folhas no tempo frio ou muito seco. O cristão, cheio de vida,
não se abate quando as dificuldades aparecem, pois está sempre rejuvenescido
pela presença do Espírito Santo e alimentado pela Palavra de Deus (Ef. 6:10).
2. O Caminho da
Condenação
“Os
ímpios não são assim, são, porém, como a palha que o vento dispersa” (Sl. 1:4).
O salmista pôde, com
propriedade, ter comparado os ímpios a uma árvore que rapidamente murcha. O
homem que não vive em contato com Deus é como gramínea sem raiz, sem fruto, sem
frescura, sem vigor vital interior. Não tem nenhuma estabilidade, nenhuma
frescura e nenhuma graça atrai. O seu caráter, conduta e destino são errados,
porque preferiu ter Deus fora de sua vida.
Ele tem a sua casa construída sobre a areia. Não tem
alicerces. Ao chegar ao término da carreira, verá que correu em vão,
desancorado, sem fundamento, sem lar, sem Deus, sem luz no anoitecer da vida. E
ao passo que o caminho do justo desemboca na vida eterna, a vida do iniquo é
visceralmente ridícula, malbaratada, desorientada, terminando na morte eterna.
Com essa forma de
discurso, o Espírito Santo nos ensina a contemplar com os olhos da fé o que de
outra forma nos pareceria incrível, pois ainda que o ímpio agora viva
prosperamente e se eleve e surja de forma sobranceira, à semelhança de uma
árvore imponente, descansemos certos que aos poucos será mesmo como palha ou o
refugo, porque quando o Senhor no seu devido tempo o expulsar do seu trono
aparente de prosperidade e o arrojar da alta posição em que se encontra pela
humilhação, ele será levado para lá e para cá com o sopro da ira do Senhor. A
vida do ímpio é como um vai-e-vem sem direção, inseguro, sem qualquer esperança
de ficar no mesmo lugar, sem fruto, sem atratividade e sem frescura, é como a
moinha, sem peso, sem conteúdo e sem valor algum. No presente, é desprezível. A
sua ruina é inevitável. Os que deixam a Palavra de Deus e seguem doutrinas
enlatadas, modismos de homens perversos, são assim também: “levados
em roda por todo vento de doutrina” (Ef. 4:14; Sl. 37:10; Ml. 4:1).
Aquele versículo trata do juízo de Deus contra os maus,
contra os que deliberadamente decidem escolher caminhos tortuosos e distantes
do Senhor. “Moinha” ou “palha” servem para mostrar que tais pessoas são superficiais,
não possuem raiz (o contrário da árvore do v. 3), peso ou utilidade, pois a
palha serve apenas para ser espalhada pelo vento ou para ser queimada. Na
colheita do trigo, o cereal é debulhado e jogado para cima, de forma a separar
a palha do alimento. A palha é dispersada pelo vento.
O
salmista bem poderia, com propriedade, ter comparado os ímpios a uma árvore que
rapidamente murcha, à semelhança de Jeremias que os compara ao arbusto que
cresce no deserto (Jr. 17:6). Considerando, porém,
que tal figura não era suficientemente forte, ele os avilta ainda mais,
empregando uma outra (figura) que os exibe por um prisma que os torna ainda
mais desprezíveis. E a razão é porque ele não mantém os seus olhos postos na
condição de prosperidade da qual se vangloriam por um curto tempo, mas a sua
mente está seriamente na destruição que os aguarda e que, finalmente os
surpreenderá. Portanto, eis o significado: embora os ímpios vivam no momento prosperamente,
todavia vão paulatinamente se transformando em palha; pois quando o Senhor os derribar,
ele os arrojará de um lado para o outro com a sua fulminante ira.
“Portanto, os ímpios
não prevalecerão no juízo, nem os pecadores na congregação dos justos.
Porque o Senhor conhece o caminho dos justos, mas o caminho dos ímpios
perecerá” (Sl. 1:5-6).
Pela parábola do trigo
e do joio (Mt. 13:24-30), entendemos que o ímpio pode permanecer num estreito
relacionamento com os cristãos, inclusive participando de todas as atividades
da igreja. No entanto, haverá um dia em que serão apartados, como bodes das
ovelhas (Mt. 25:32; Ec. 8:13).
O Senhor conhece todas as coisas, inclusive o
caminho do justo e o do ímpio. Isso torna a situação do pecador mais
desconfortável, pois de modo algum escapará no juízo final (Sl. 9:16).
Diante do Juiz, não há argumentos ou defesa no Dia
do Juízo. As escolhas já terão sido feitas. Não haverá mais tempo para mudar de
opinião. Não entrará pecado na Cidade Celestial; assim, não haverá lugar para
pecadores impertinentes na congregação dos justos. Leia Isaías 2:10-21.
A advertência divina é que: “os ímpios serão lançados no
inferno e todas as nações que se esquecem de Deus” (Sl. 9:17). “Portanto,
o seu caminho lhes será como lugares escorregadios na escuridão; serão
empurrados e cairão nele; porque trarei sobre eles mal, o ano mesmo da sua
visitação, diz o Senhor” (Jr. 23:12).
Ele não apenas tem informações sobre o justo, como
também se preocupa com ele. Veja a expressão de Davi: “Eu me alegrarei e regozijarei no teu amor, pois consideraste a minha
aflição e conheceste a angústia da minha alma” (Sl. 31:7). E: “Ó Senhor, tu me sondaste e me conheces”
(Sl. 139:1). Deus se identifica com as nossas necessidades. Creia nisso. Já o
caminho (viver) do ímpio “perecerá”. Aqui, os dois caminhos se separam. Para
sempre. Lembremo-nos: não existe um terceiro caminho. Lembremo-nos das palavras
de Jesus: “Quem comigo não ajunta,
espalha” (Mt. 12:30b).
No quinto versículo, o salmista ensina que uma vida
feliz depende de uma sã consciência, e que, portanto, não é de admirar que o
ímpio de repente se veja sem aquela felicidade que julgara possuir. E há
implícita nas palavras, uma espécie de concessão: o profeta tacitamente
reconhece que os ímpios se deleitam e desfrutam e triunfam durante o reinado da
desordem moral no mundo; justamente como os ladrões se regalam nas florestas e esconderijos,
enquanto se veem fora do alcance da justiça. Ele nos assegura, porém, que as
coisas nem sempre correrão bem em seu presente estado de confusão, e que quando
forem reduzidas ao seu real estado, tais pessoas ímpias se verão inteiramente
privadas de seus prazeres, e perceberão que foram enfatuadas imaginando ser felizes.
E assim percebemos que o salmista apresenta o ímpio como sendo um miserável, visto
a felicidade ser uma bênção interior procedente de uma sã consciência.
O salmista não nega
que, antes que compareçam a juízo, todas as coisas foram bem-sucedidas com eles;
mas ele nega que sejam de facto felizes, a menos que tenham substancial e
inabalável integridade de caráter para se manterem; pois a genuína integridade
dos justos se manifesta quando ela finalmente é provada. É deveras verdade que
o Senhor exerce juízo diariamente, quando faz distinção entre os justos e os perversos;
visto, porém, que isso só é feito parcialmente nesta vida, devemos olhar mais alto
se desejamos ver a assembleia dos justos, da qual se faz menção aqui.
Mesmo neste mundo a
prosperidade dos ímpios começa a escoar-se assim que Deus manifesta os emblemas
de seu juízo (porque, sendo despertos do sono, são constrangidos a reconhecerem,
queiram ou não, que não têm qualquer parte na assembleia dos justos); visto,
porém, que isso nem sempre se concretiza em relação a todos os homens, no presente
estado, devemos pacientemente esperar o dia da revelação final, quando Cristo
separará as ovelhas dos cabritos. Ao mesmo tempo, devemos ter como verdade geral, o facto de
que os ímpios estão destinados à miséria; pois suas próprias consciências os condenam
em virtude de sua perversidade; e, assim que forem convocados a prestar contas
de sua vida, seu sono será interrompido, e então perceberão que estiveram meramente
sonhando quando eles acreditavam ser felizes, sem visualizar em seu interior o
real estado de seus corações.
Além do mais, as coisas aqui parecem ser atiradas à mercê da sorte e como não nos
é fácil, no meio da confusão reinante, reconhecer a verdade, o que o salmista
havia dito, ele, pois, apresenta, para nossa consideração, o grande princípio
de que Deus é o Juiz do mundo. Isso concedido, segue-se que não pode haver
outra sorte para o reto e o justo senão o bem-estar, enquanto que, em contrapartida,
outra sorte não será revelada ao ímpio senão a mais terrível destruição.
De acordo com toda a
evidência externa, os servos de
Deus não podem extrair qualquer benefício de sua retidão; mas, como é o ofício
peculiar de Deus defendê-los e tomar providência em favor de sua segurança,
eles devem viver felizes sob sua proteção divina. E de tal facto, podemos também
concluir que, como Deus é o inexorável vingador contra os perversos, ainda que
por algum tempo ele pareça não notar o que o ímpio faz, finalmente o visitará com
a destruição. Portanto, em vez de admitirmo-nos ser enganados com a sua imaginária
felicidade, tenhamos sempre diante de nossos olhos, em circunstâncias de stress,
a providência de Deus, a quem pertence a prerrogativa de estabelecer os negócios
do mundo e fazer com que, do caos, surja a perfeita ordem.
Deveras, o primeiro salmo nos dá cordial
encorajamento para nos agradarmos da lei de Deus, evitando a intimidade dos que
realmente não amam o Altíssimo. Este proceder resultará em sermos felizes, não
apenas por alguns anos, mas eternamente, como servos leais de Deus.
Aplicações do Salmo 1 Para a Igreja de Hoje
a) Planejando seu crescimento espiritual.
O salmista nos indica o
caminho para uma vida inteiramente entregue a Deus, conhecendo a sua Palavra e
dela tirando bons conselhos. A vida que se quer ter daqui a 5, 10, 20, 40 ou 60
anos, depende de nossas decisões que tomarmos hoje.
b)
Escolhendo que tipo de pessoa quer ser.
O justo é direcionado por Deus, usa seu tempo em
coisas espirituais, busca boas companhias, gosta do estudo bíblico,
apresenta-se diante de Deus para agradá-lo. O ímpio é superficial, zombador,
carnal, vive pecando, é sem direção, perdido, sofrido pelas tempestades da
vida. A ideia é de pessoa desassossegada, inquieta, em constante desarmonia.
c)
O cristão tem prazer no ensino bíblico!
Este é o segredo do sucesso na vida do justo. A
Bíblia é a nossa norma de conduta. Todo aquele que deseja ser bem-sucedido na
vida deve se interessar pelo que Deus falou, fez e revelou nas Escrituras. Os
ensinos adquiridos ao longo da vida do fiel tornam-se nossa regra de conduta.
Tal como a árvore plantada junto a ribeiros de águas, o fiel vai sendo
“irrigado” pela Palavra de Deus.
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