“Nada
façais por espírito de partido ou vanglória, mas que a humildade vos ensine a
considerar os outros superiores a vós mesmos” (Fp. 2:3).
Introdução
Gostaria
de começar por falar de como é nobre, esplêndido e honroso servir uns aos
outros. Hoje em dia muitas pessoas se esqueceram de praticar este lindo acto,
pois vivemos numa sociedade onde a grandeza tem como ícone o poder e num
contexto em que ser grande é ser servido. Quem serve é visto como alguém sem
esperteza.
Mas
Jesus, alguém que tem os anjos para O servirem, abriu mão dessa
mordomia, se fez carne e veio e viveu para servir aos homens a ponto de dar a sua vida para resgatá-los da
morte,
deixando assim claro que servir é a maneira mais nobre de viver. Ele nos ensina
que ser grande é ser servo de todos. Almejar ser servido o tempo todo não é
algo saudável. O autor Jim Smith comenta que: “Querer e precisar ser servido
pelos outros não é um factor gerador de vida, mas um fator destruidor de alma”.
Hoje a maioria dos crentes não querem servir a Deus,
mas servirem-se de Deus. Enxergam a igreja como um balcão de serviços a seu favor. Não se enxergam como serviçais mas como
senhores e Deus como o serviçal. Basta Deus fazer um milagre e tudo o que
querem é o milagre e não mais o Deus que o fez.
Vejamos este fenómeno acontecer no exemplo do milagre
da multiplicação. “E disse Jesus: Mandai
assentar os homens. E havia muita relva naquele lugar. Assentaram-se, pois, os
homens em número de quase cinco mil. E Jesus tomou os pães e, havendo dado
graças, repartiu-os pelos discípulos, e os discípulos, pelos que estavam
assentados; e igualmente também os peixes, quanto eles queriam. Vendo, pois,
aqueles homens o milagre que Jesus tinha feito, diziam: Este é,
“verdadeiramente, o profeta que devia vir ao mundo. Sabendo, pois, Jesus que haviam de vir arrebatá-lo, para o fazerem rei,
tornou a retirar-se, ele só, para o monte” (Jo. 6:10-15).
Assim que a multidão viu o milagre da multiplicação
dos pães, viram logo uma oportunidade de terem aquele milagre de forma
permanente: “Vamos fazê-lo Rei, e assim teremos pão de graça todos os dias”.
Tente
no seu dia-a-dia mudar de posição, deixando de se focar somente em si e focando-se
no outro. “Quem preferem ser? O que come
o jantar ou o que serve? Preferem comer e ser servidos? Mas eu assumi entre vós
o lugar de quem serve” (Lc. 22:27).
Paulo,
no grande hino do capítulo treze da primeira Carta aos Coríntios, diz que o
amor não busca os seus próprios interesses (1 Co. 13:5), e exorta também os
cristãos de Filipos a nada fazer por espírito de partido ou vanglória, mas –
como ele escreve – “que a humildade vos
ensine a considerar os outros superiores a vós mesmos. Cada qual tenha em vista
não os seus próprios interesses, e sim os dos outros” (Fl. 2:3-4). Essas
palavras são um eco da constante exortação de Cristo a servir, atitude
imprescindível para imitá-Lo: “O Filho do
homem veio, não para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate
por muitos” (Mt. 20:28).
Estas
últimas palavras foram pronunciadas por Jesus para encerrar um triste incidente
que se deu entre os Apóstolos. Vale a pena recordá-lo…, para meditar e
aprender.
Aconteceu
que, indo Jesus a caminho de Jerusalém com os seus discípulos, Tiago, João e
sua mãe foram até Jesus solicitar privilégios na consumação do reino de Deus. A
mãe adotou um ar solene, um olhar suplicante: Prostrou-se diante de Jesus, para
lhe fazer um pedido. E o que pediu? O melhor para os filhos, como é próprio de
uma mãe: Ordena que estes meus dois filhos se sentem no teu Reino, um à tua
direita e outro à tua esquerda. Nada menos! Pedia os dois primeiros lugares
naquele Reino que tanto ela como os filhos ainda o imaginavam como um reino
terreno.
Jesus
olhou-a, imagino que carinhosamente divertido, e não disse nem que sim, nem que
não, mas aproveitou para reforçar que o reino de Deus é reino de servos e,
portanto, os servos são os verdadeiros governantes do mundo. Sorrindo,
dirigiu-se aos dois que tinham vindo conchavados com a mãe, e disse-lhes: Não
sabeis o que pedis. Podeis vós beber o cálice que eu devo beber? Cristo ia ser,
certamente, Rei, mas o seu Reino seria conquistado pela Cruz, por meio da sua
entrega redentora. Eles não sabiam ainda o que isso significava, saberiam mais
tarde; mas, mesmo assim, com simplicidade inconsciente, respondem sem hesitar:
Podemos! Como que a dizer: “Estamos
dispostos a tudo, contanto que nos tenhas, no Reino, como homens de confiança,
bem perto de ti”.
Foi
aí que irrompeu o conflito. Os dez outros (Apóstolos), que haviam ouvido tudo,
indignaram-se contra os dois irmãos. Pronto, já estava armada a briga. O
Evangelho não a descreve com detalhes, mas todos sabemos as caras que fazemos,
as palavras que dizemos e o tom com que falamos quando estamos morrendo de
raiva. No caso, morrendo de inveja: “Quem pensam que são esses dois, que querem
passar à frente de todos nós, e ainda por cima com artimanhas de politicagem
materna”?
Jesus,
calmo e entristecido pelo espetáculo, chamou-os. “E disse-lhes: Sabeis que os chefes das nações as subjugam, e que os
grandes as governam com autoridade. Não seja assim entre vós. Todo aquele que
quiser tornar-se grande entre vós faça-se vosso servo. E o que quiser tornar-se
entre vós o primeiro faça-se vosso escravo. Assim como o Filho do homem – o próprio
Jesus – veio, não para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate
por uma multidão” (Mt. 20:20-28).
A
ambição dos dois irmãos e a explosão irritada dos outros dez deram ensejo ao
Senhor para expor uma das lições mais belas do Evangelho: o espírito de
serviço. Por outras palavras, diz-lhes: “Não se comparem, para ver se um é mais
do que o outro; não se deixem arrastar pela inveja e uma competitividade
vaidosa; pelo contrário, a vossa ambição deve ser dar-se totalmente e servir,
por amor, como Eu faço. Aí encontrarão a felicidade: servindo e dando alegrias,
e não procurando a alegria vaidosa de ser mais que todos”.
Servir
é para quem conhece o amor, de tal maneira que desconhece preço elevado demais
para que possa continuar servindo. Servir é para quem conhece o fim a que se
pode chegar servindo e amando, de tal maneira que não é motivado pelo
reconhecimento, a gratidão ou a recompensa, mas pelo próprio privilégio de
servir. Servir é para gente parecida com Jesus. Servir é para muito pouca gente.
Muitos
desejam o poder do trono sem estarem preparados para pagar o preço do
sofrimento. Outros dizem levianamente: “Nós podemos”, pouco apercebidos do que a
sua escolha envolve, e que nada, senão a graça de Deus, pode tornar possível o
cumprimento do voto. Mas a graça é suficiente! Basta buscá-la. Deus não
falhará! Observe o versículo 28. O Senhor ministra a todos nós, todos os dias,
paciente e amorosamente. Ele tomou a forma de servo e se mostrou obediente.
Sirvamos a todos os homens por amor a Ele! Temos de descer para chegar ao seu
lado.
Talvez o pedido dos dois irmãos fosse
motivado mais pelo desejo de estar perto do Mestre do que pela ambição; mas, em
qualquer caso, há somente um preço a ser pago. Precisamos de conhecer a
comunhão dos seus sofrimentos se pretendemos participar de sua glória (2 Tm.
2:11 e seguintes). É fácil dizer: “Nós somos capazes”; mas se estes dois
pretendentes não tivessem vivido a experiência do dia de Pentecostes, com toda
a certeza teriam fracassado (Fp. 4:13). Se alguém não foi chamado para sofrer
com ele, então deve servir. Um serviço semelhante ao de Cristo o levará para
junto do trono dele, como sua participação no seu sofrimento. Como no caso de
Bartimeu, os obstáculos e as dificuldades, ao invés de nos desalentar, devem
nos incitar a orar com maior fervor. Somente a fé poderia fazer com que um cego
lançasse de si a capa. Jesus certamente lhe restauraria a visão, e ele sabia
que, então, seria capaz de reencontrá-la.
1.
A Grandeza de Servir,
Servir, Servir
“Servir uns aos outros, cada um conforme o
dom que recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus” (1 Pe.
4:10).
Espelhando-me
no adágio popular, “quem não vive para servir, não serve para viver”, digo que
só se serve servindo. Servir uns aos outros e não uns e outros é um dos
mandamentos recíprocos que precisa de ser colocado em prática nos
relacionamentos interpessoais; a exemplo do Mestre da Vida, Jesus, que veio
para servir e não para ser servido. Todos precisam imitar esta nobre virtude do
Mestre. Este espírito de servir deve estar presente em toda gente,
principalmente nos que são identificados como o sal da terra e a luz do mundo.
Toda a liderança só será eficaz se exercitar o espírito de servir e servir sem
acepção de pessoas; é uns aos outros que devemos servir e não uns e outros.
Tudo o que temos e somos vem de Deus, portanto devemos ser bons mordomos de
tudo o que temos e somos; recebemos o dom não para nos apropriarmos dele, mas
para o serviço do reino, para um fim proveitoso, para a edificação do corpo de
Cristo, a sua Igreja. O Espírito Santo nos concede o dom para servirmos e não
sermos servidos. Deus não quer filhos egoístas, retentores das bênçãos, quer
filhos generosos, altruístas, amorosos, abençoadores, servos...
A
mensagem é clara: para termos o espírito de serviço que é próprio do cristão,
devemos pôr-nos em condições de ser úteis, e estar dispostos a servir realmente.
Com
efeito, servir significa, em primeiro lugar, que alguém é útil, serve, presta, cuida,
exerce, oferece, fornece; da mesma maneira que dizemos das coisas materiais:
“esta ferramenta serve; esse tecido não presta, não tem serventia”. Para
servir, é preciso ter qualificação, preparo, condições pessoais para poder
prestar determinados serviços.
Servir
é um acto muito mais ligado ao qualitativo do que ao quantitativo; muito mais
ao emocional do que ao racional; muito mais ao satisfazer-te do que ao
satisfazer-me. Mas ser servo não basta, é preciso ter um coração de servo de
fato, onde o levará a servir espontaneamente, sem esperar nada em troca e nem
ser reconhecido. Cada um de nós deve ter os irmãos como superiores, deve buscar
atender os interesses dos irmãos e não os próprios interesses. Isso é servir! É
assim que, verdadeiramente, somos servos! É sair do “eu” para o “nós”. E sair
da vontade, da preferência, da visão, do desejo, do pensamento, do serviço, pessoal
para viver a vontade, a visão, a preferência, o desejo, o pensamento, o
serviço, comunitário.
Ter
os outros como superiores não é algo só para ser vivido entre os irmãos, mas
para ser estendido a todos os que nos rodeiam, para nossa família, para Igreja
e para o mundo. É ser servo de todos, ou seja, é ter os irmãos como superiores.
Mas é claro, que a comunidade, por sua realidade oferece, sem dúvida, infinitas
oportunidades para buscarmos os interesses dos outros e não os nossos.
Numa
segunda acepção, o verbo servir indica o acto e o espírito de serviço: a
atitude da pessoa prestativa, serviçal, dedicada, sacrificada. Para servir…, o
único jeito é dedicar-se, servir mesmo.
Em
ambos os sentidos, servir é caminhar na contramão do egocentrismo; é
esforçar-se com generosidade em colaborar com o bem e a alegria dos outros.
A
Bíblia diz que o servo é aquele que se faz escravo, não reivindica nada, não
exige os seus direitos. O que reivindica e exige seus direitos não é servo, é
empregado. Podemos servir com um sorriso, abraço, uma palavra, atenção a
alguém, etc… “porque, sendo livre de
todos, fiz-me escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível” (1
Co 9.19).
O
caminho do serviço é estreito, poucos são os que andam por ele, é mais fácil o
caminho da zona de conforto, do ser servido. Mas, apesar de ser estreito o
caminho dos servos, é um caminho fascinante de se andar, fomos chamados para
sermos uma bênção e brilharmos diante dos homens com as nossas boas obras, para
que eles glorifiquem ao nosso Pai que está nos céus.
Se
almeja alguma posição, como cristão, torne-se primeiro um servo. Ponha isso na
mente, só se serve servindo. Ponha o dom recebido do Espírito Santo a serviço
dos outros. É abençoando que somos abençoados. Existem pessoas que possuem
sonhos e metas, mas não alcançam seus objetivos porque não aprenderam a servir.
Temos que ser servos em qualquer posição em que estamos servindo. “Se alguém me quiser servir, siga-me; e onde
eu estiver, ali estará também o meu servo; se alguém me servir, o Pai o honrará”
(Jo. 12:26).
O
maior exemplo de servo é Jesus, onde nos ensina de como servir ao Pai Celestial
e também uns aos outros. “Assentando-se,
Jesus chamou os doze e disse: Se alguém quiser ser o primeiro, será o último, e
servo de todos” (Mc. 9:35).
Eu
poderia escrever mais sobre este assunto, mas melhor do que escrever, é
começarmos a viver mais este acto tão simples, nobre e perfeito que Jesus nos
ensinou, que é servir.
“Tende em vós aquele sentimento que houve
também em Cristo Jesus, o qual, subsistindo em forma de Deus, não considerou o
ser igual a Deus coisa a que se devia aferrar, mas esvaziou-se a si mesmo,
tomando a forma de servo, tornando-se semelhante aos homens; e, achado na forma
de homem, humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até à morte, e morte de
cruz. Pelo que também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu o nome que é
sobre todo nome; para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão
nos céus, e na terra, e debaixo da terra, e toda a língua confesse que Jesus
Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai” (Fp. 2:5-11).
Que vivamos para servir os irmãos em
unidade com a vontade de Deus! Que saibamos aproveitar as oportunidades que
Deus nos oferece através de nossas comunidades e, assim, que passemos a
“considerar os outros superiores”. Amém.
2.
Honrar aos Outros Com o Nosso Ouvir
“Nada façais por
espírito de partido ou vanglória, mas que a humildade vos ensine a considerar
os outros superiores a vós mesmos” (Fl. 2:3).
Se
avaliarmos hoje, ainda que superficialmente, as nossas incompatibilidades
comportamentais e os desajustes de nossos relacionamentos, veremos que, quase
na sua totalidade, estas se dão por conta de uma comunicação esfacelada, onde
muito dos ouvintes quase nunca ouvem aquilo que lhes é comunicado, retendo tudo
do mesmo modo como lhes fora transmitido, surgindo, portanto, mais uma das
implicações que tem tornado difícil à tarefa do ouvir.
Gostaria de partilhar convosco algo que aprendi em oração,
numa ocasião em que pedi ao Senhor para ser uma pessoa menos impulsiva ao
falar, pois sempre me apressava a dar a minha opinião sobre tudo.
Aprendi a dar ao meu ouvido um novo sentido,
“emprestando”, por assim dizer, os meus ouvidos ao Senhor para se tornarem
ouvidos de discípulo, esforçando-me para ouvir mais, ser mais atento, não me
apressando em falar, fazendo do acto de ouvir um acto sagrado. Passei a
exercitar a cautela, a prudência, não me apressando a dar a minha opinião sobre
tudo.
Existe,
um diferencial entre aquele que ouve e aquele que simplesmente escuta. O ouvir
é diferente, pois o seu exercício é criteriosamente responsável pelas
informações que lhe são transmitidas e, uma vez tendo sido armazenadas em nossa
mente, esta é que condicionará todo o nosso comportamento, principalmente em
relação àquele com quem se está comunicando.
Percebi então que saiu um grande peso de minhas costas
quando passei a dar menos importância ao facto de os outros saberem ou não o
que penso sobre tudo. Passei a fazer uma espécie de silêncio em oração, orando
no meu coração ao Senhor enquanto ouvia os outros falarem. Surpreendi-me de
como o meu entendimento ficou apurado, refinado através do ouvir os outros,
percebia melhor as nuances das verdadeiras intenções dos outros ao falarem e,
sobretudo, uma maior clareza do certo e do errado. Na minha impulsividade eu
era também rápido em aderir à opinião dos outros, mas passei a submeter minha
opinião ao Senhorio de Jesus.
Ao consagrar ao Senhor os meus ouvidos e o meu julgamento
das coisas, eu sentia como se o meu silêncio fosse uma espécie de espera na
presença de Deus, até que Ele se manifestasse, dando-me clareza sobre o que
falar e quando falar. Sentia que Deus agia enquanto eu orava em silêncio,
iluminando meu entendimento.
Outra coisa, ainda, foi que passei a ter uma atitude
mais humilde, não mais supervalorizando a minha opinião e passando a considerar
que os outros também poderiam ter algo importante para dizer e que talvez o que
eles tivessem a dizer se aproximasse mais da verdade do que eu poderia supor.
Passei a honrar os outros no meu coração e nos meus pensamentos e isso melhorou
muito o meu relacionamento com as pessoas.
Que o Senhor nos ajude e continue a nos ensinar para que possamos ser
cada vez mais mansos e humildes e termos assim o nosso coração em paz.
3. Ouvir de Modo
Adequado
Ouvir de maneira que se compreenda a
profundeza das intenções do coração de alguém é, sem dúvida, uma prática que
está fora do nosso alcance, mesmo porque o atributo da omnisciência pertence
somente a Deus. O máximo que podemos conseguir é conjecturar através de uma
interpretação decorosa e subtil e, ainda assim, carregada de indubitáveis
imperfeições.
A
maneira como nos propomos a ouvir é que determina a qualidade de nossas atitudes.
Por exemplo, quando os irmãos de José (do Egito), filho mais novo de Jacó, o
ouviram contar acerca do sonho que tivera, estes o invejaram (Gn. 37:11), pois
não admitiam que seu irmão mais novo estivesse dizendo que, algum dia,
exerceria autoridade e domínio sobre eles. E, como resultado dessa leviana
interpretação auditiva, traíram José e o venderam aos mercadores midianitas (Gn.
37:28).
Se
obstinadamente nos inclinarmos a ouvir tudo de modo arrogante, certamente nossa
atitude será coagida a proceder de modo similar. Por outro lado, se formos
humildes e nos detivermos numa compreensão desarmadora de nosso próprio
egoísmo, estaremos então atingindo a verdadeira diplomacia auditiva.
Precisamos
de aprender a ouvir. Ainda quando crianças, nossas primeiras palavras foram
ditas como resultado de um intenso exercício da audição. Isso porque, ao
ouvirmos as pessoas falar, tentávamos reproduzir, de igual modo, alguns
fonemas. Assim que, uma vez tendo aprendido a falar ouvindo, devemos, portanto,
aprender a ouvir nos calando. Já nos recomenda as Escrituras, dizendo: ”todo homem seja pronto para ouvir, tardio
para falar...” (Tg. 1:19).
4.
O Benefício de Quem
Realmente Ouve
A
palavra de Deus nos traz a menção realçada da importância do ouvir verdadeiramente
o que está a ser dito, processar a informação e usá-la de forma efetiva, e ser
beneficiado por essa iniciativa: : “Se
quiserdes e me ouvirdes comereis o melhor desta terra” (Is. 1:19); “Inclinai os vossos ouvidos, e vinde a mim,
ouvi e a vossa alma viverá...” (Is. 55:3). Essas são apenas algumas das
citações bíblicas, entre tantas outras, que nos dão todo o aparato legal para
usufruirmos os deleites de uma boa audição. Devemos admitir que, como seres
humanos falhos e susceptíveis às tendências do engano, acabamos por exercer a
audição de maneira negligente, e, por essa razão, sofremos com as consequências.
Por isso, é comum encontrarmos pessoas por aí dizendo: Fulano não me quis
ouvir... por isso quebrou a cara!
Acredito existir apenas duas razões
principais por que as pessoas se recusam a ouvir atentamente umas às outras: a
primeira por causa do orgulho. Aquilo que é dito pelos outros quase nunca tem
relevância para o ouvinte orgulhoso, pois julga que somente ele é que detém o
“conhecimento” e que as demais pessoas nada sabem. A segunda por causa da
ignorância. O desconhecimento de alguns assuntos muitas vezes impede que as
pessoas destinem total interesse em ouvir aquilo que lhes é comunicado.
5.
Ouvir é Também Ministrar.
O
Senhor nos dotou dessa excepcional capacidade para nos oferecermos a Ele como
instrumentos da sua justiça (Rm. 6:19). Compete a nós exercê-la de tal modo que
Deus venha a ser glorificado. Veja o que Dietrich Bonhoeffer, teólogo luterano
do século passado, diz a esse respeito:
“O
primeiro serviço que alguém deve ao outro na comunidade é ouvi-lo. Assim como o
amor a Deus começa com o ouvir a sua Palavra, assim também o amor ao irmão
começa com aprender a escutá-lo. É prova do amor de Deus para connosco, que não
apenas nos dá a sua Palavra, mas também nos empresta o ouvido. Portanto é
realizar a obra de Deus no irmão quando aprendemos a ouvi-lo. Cristãos, e
especialmente os pregadores, sempre acham que têm algo a ‘oferecer’ quando se
encontram na companhia de outras pessoas, como se isso fosse o seu único
serviço. Esquecem-se que ouvir pode ser um serviço maior do que falar. Muitas
pessoas procuram um ouvido atento, e não o encontram entre os cristãos, porque
esses falam quando deveriam ouvir...” (Vida em Comunhão, 1938).
Bonhoffer traduz, com precisão, aquilo
de que tanto necessitamos resgatar em nossas comunidades cristãs, que é o
serviço da audição. Temo-nos detido em diversas atividades com vistas ao
serviço ao próximo, entretanto pouco temos enfatizado sobre a real necessidade
de se ouvir, sem reservas, os anseios e angústias do coração humano. Que a
preciosa graça de nosso Senhor Jesus Cristo nos ajude a frutificar em toda boa
obra. Ouvir é uma delas (Cl. 1:10).
6.
Uma Fina Camada de
Prata Faz a Diferença
Nada façais por
espírito de partido ou vanglória, mas que a humildade vos ensine a considerar
os outros superiores a vós mesmos. Cada qual tenha em vista não os seus
próprios interesses, e sim os dos outros (Fp 2:3-4).
A
palavra de Paulo está alicerçada no modelo de Amor de Jesus. Os cristãos, em
todos os tempos, têm como referencial a forma como Jesus amou e se doou às
pessoas. Eles seguem o novo modelo de vida chamado Jesus.
O Senhor Jesus convida-o a olhar para
além de Si mesmo e perceber que há outras pessoas neste mundo. É incrível: elas
precisam do seu amor, cuidado e carinho. Quem se volta para si mesmo, pensa que
é o único. Engana-se e é privado da razão de viver. O Amor de Jesus, porém,
liberta-nos de nós mesmos e nos dispõem a repartir nosso pão.
7.
Em Meus Passos, o
Que Faria Jesus?
Um
vizir (título
usado em alguns países muçulmanos para designar autoridades como ministros de
Estado), conhecido por sua avareza, arrogância e orgulho, conversava com um
sábio, buscando conselho e orientação. Vivia inquieto e angustiado, mas sem
saber ao certo os motivos de sua preocupação. O sábio levou o ministro à janela
e, mostrando-lhe a rua, perguntou: “o que o senhor está vendo?” Ele respondeu:
“vejo muita gente andando, homens, mulheres, crianças”. Então o sábio colocou
na janela, entre o vizir e a rua, um espelho. “E agora”, perguntou o
conselheiro, “o que o senhor vê?” “ Vejo-me a mim mesmo!” “O que distingue o
vidro da janela e do espelho é apenas uma fina camada de prata. A prata impede
que o senhor veja os outros e faz com que se concentre em si mesmo”, argumentou
o conselheiro.
Pergunte-se
novamente: o que tem preocupado o seu coração? Ou: o que tem ocupado o seu
coração no dia-a-dia? São seus planos e sonhos pessoais? Suas conquistas têm
determinado o ritmo de sua vida?
O Senhor Jesus convida-o a olhar para
além de Si mesmo e perceber que há outras pessoas neste mundo. É incrível: elas
precisam do seu amor, cuidado e carinho. Quem se volta para si mesmo, pensa que
é o único. Engana-se e é privado da razão de viver. O Amor de Jesus, porém,
liberta-nos de nós mesmos e nos dispõem a repartir nosso pão. Deixe Jesus fazer
a sua vida tornar-se diferente.
8.
Exame de
consciência
Tendo
presente o que acabamos de ver, talvez nos ajude a meditar e a falar com Deus
um exame de consciência sobre como vivemos os dois sentidos desse verbo servir.
Primeiro:
por que são tantas as ocasiões em que dizemos: “Não sei fazer, não tenho jeito,
não tenho condições”? É lógico que não saibamos fazer tudo nem sejamos aptos
para todas as tarefas. Mas há muitas coisas que deveríamos saber fazer. Por
exemplo, um pai e uma mãe deveriam saber educar os filhos e, se não sabem, é
porque não se deram ao trabalho de aprender, de formar-se, de preparar-se (o
que é, para eles, um dever grave). Outro exemplo: uma mãe de família, por mais
que tenha que trabalhar fora de casa, deveria saber cuidar com primor de todas
as coisas que tornam um lar agradável, aconchegante e bem cuidado. Que pena ver
mães com os filhos desleixados, mães que não sabem nem proporcionar uma comida
variada e gostosa, nem fritar um ovo, nem meter a roupa na máquina de lavar sem
que saia desfiada e desbotada. Se a mãe não sabe, é porque não foi responsável:
deveria ter-se preparado. A sua inaptidão e despreparo rouba alegrias que
deveria dar à família.
Segundo:
assim como é muito cômodo não saber fazer as coisas, também é muito cômodo
saber fazê-las, mas “ficar na moita”, esconder-se, mascarar-se, omitir-se.
Estamos no segundo sentido da palavra servir.
Será
que já percebemos a enorme capacidade inativa de ajudar (portanto, de servir),
que todos nós temos? Que acha se, para não ficarmos na teoria, pegássemos um
papel e um lápis e fizéssemos uma lista – em várias colunas – com as nossas
possibilidades? Por exemplo, as seguintes:
-
Primeira coluna: Pequenos serviços que eu poderia prestar, se fosse generoso,
às pessoas da minha casa (pensando em todas elas, uma por uma). Serviços
materiais (ordem, tarefas, compras, limpeza, atendimento da porta, do telefone,
etc.) que posso fazer. Ajuda no estudo dos filhos. Auxílios mais profundos, de
orientação, de aconselhamento moral e espiritual, de formação nas virtudes, que
poderia dar e não dou…
-
Segunda coluna: Pequenos serviços que poderia prestar – além dos “grandes”
serviços do próprio trabalho – no meu ambiente profissional. Modos possíveis de
auxiliar, facilitar e tornar mais amável o trabalho a colegas e subordinados.
Será que podem contar comigo, se estão atribulados? Sabem que estou disposto a
ouvir, e por isso me confidenciam as suas dificuldades?
-
Terceira coluna: E no clube, na equipe de futebol, na turma de pescadores, na bicicleta
de montanha, na dos integrantes da banda, será que não poderia ser mais
prestativo, ter mais iniciativas, ser um apoio maior, dar o couro quando é
preciso preparar festas, churrascos e outros bons momentos?
-
Quarta coluna: E com os necessitados, com os que sofrem? Que faço? Digo que não
posso fazer nada, a não ser dar esmolas de vez em quando, uma contribuição para
o orfanato e o dízimo na igreja? Digo que não sei falar, ensinar, dar aula e,
por isso, não posso prestar serviços? Mas… posso visitar doentes. Posso fazer
visitas a algum hospital ou asilo. Posso prestar algum serviço de voluntariado
(uma vez por semana, uma vez por mês…) baseado nos meus conhecimentos
profissionais (assessoria jurídica gratuita, assistência médica ou dentária,
assistência técnica para a construção de casinhas populares, aulas de
complementação, etc, etc).
Há,
sem dúvida, outras colunas, que cada qual pode descobrir sozinho e preencher;
mas sejam quantas forem, o que importa é tirar delas propósitos concretos de
servir mais, muito mais, conscientes de que assim daremos as alegrias que
devemos aos outros, e ao mesmo tempo, o nosso coração irá ficando mais cheio de
alegria e mais próximo do coração de Cristo que não veio para ser servido, mas
para servir, e do coração de Maria, quer só queria ser a serva do Senhor,
pronta para fazer tudo quanto Ele lhe pedisse: Eis aqui a serva do Senhor,
faça-se em mim segundo a tua palavra (Lc. 1:38).
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